Os computadores e tablets não conseguem ensinar a sabedoria, a solidariedade e o amor pela vida. Não nos podemos esquecer que os professores são os alicerces das profissões e o sustentáculo do que é mais lúcido e inteligente em nós. O pouco de luz que entra na sociedade vem do coração dos professores e da família, que educam arduamente as suas crianças.
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Deixo claro desde já que não sou entendida em religiões, que o pouco que sei aprendi na escola ou na missa a que assistia em pequena por gostar das cantorias e da brincadeira a seguir, quando os meus amigos eram, finalmente, dispensados pelas catequistas. Sei que é ténue a linha entre a liberdade de expressão e a ofensa. Espero não cruzá-la.
Sempre foi, para mim, muito difícil compreender como é que pessoas com altos graus académicos, cultura e inteligência, são religiosas. Enquanto adolescente fui sempre – preto ou branco – Religião/Espiritualidade vs. Ciência/Evolução/Liberdade, e não havia outro caminho. À medida que fui crescendo, as minhas ideias tornaram-se menos rígidas, comecei a acreditar que há mais à nossa volta do que o estritamente palpável e, hoje, acredito plenamente no poder da atração. Quase como “Querer é poder” mas com algumas limitações. De qualquer forma, à medida que fui lendo, estudando e compreendendo a forma como opera o mundo, mais claro me foi ficando que a religião não tem nada a ver com espiritualidade e nunca foi mais do que uma forma de controlar hábitos, tradições, culturas, ideais e pessoas. Para mim é um facto: a religião serviu durante séculos (e ainda serve!) como meio para a obtenção de poder. Uma forma de coagir as massas a obedecerem a certos padrões comportamentais que são “supostamente” os corretos. Uma forma de controlar, através do medo do castigo, todos os que ousassem pensar ou sentir de forma diferente da estipulada. Porque nada é mais temível do que o desconhecido. E assim se tutela e contraria a evolução, o desenvolvimento social e os movimentos pela liberdade. Desta forma, é-me muito difícil compreender que qualquer pessoa com 3 dedos de testa se curve perante uma autoridade que não dá provas, que não é palpável e que é representada por pessoas que não têm sido mais do que implacáveis opressores (é só olhar para a história). Tem servido a religião (todas e mais algumas) como desculpa perfeita para iniciar milhentas guerras sangrentas, massacres, torturas e imposições. Continua a ser a Religião (como dissimulação dos interesses económicos) a maior causa de conflitos do mundo. Ainda hoje andamos a lutar – legalmente – num país (supostamente) laico, para despenalizar alguns dos pecados da Bíblia. Ainda hoje, num estado (supostamente) laico, andamos a ensinar Religião nas escolas. Bem sei que não é o estado que paga essas aulas, mas são os meus, os nossos impostos que pagam todas as infraestruturas que as possibilitam – cadeiras, salas de aula, funcionários, eletricidade, etc. Andam a ensinar, nas escolas que todos sustentamos, religiões que só alguns apoiam e que oprimem a mulher. E com elas não andarão, também, a ensinar princípios como o da não contraceção? Censura ao aborto? Abstinência sexual? Conceito de família tradicional como correto? (bem…isto daria outro texto, com certeza) Mas o que mais de perturba desde que me debrucei sobre as teorias do feminismo, da igualdade e da liberdade, são as mulheres que se assumem como feministas, e como religiosas, simultaneamente, mesmo sabendo tudo o que isso acarreta. Principalmente as que são religiosas católicas, pois é o cenário com que mais me deparo. Tenho tentado, ao máximo, compreender esta realidade, tanto porque sei que existe e devo respeitá-la, como porque tornar-me intransigente é um dos meus medos. Mas torna-se extremamente complicado respeitar algo que, para mim, é inconcebível. Gostava realmente que alguém me conseguisse apresentar argumentos sólidos que me demonstrassem que ser pela liberdade individual de escolha e pela igualdade de género, não contraria obrigatoriamente o ser-se católico, mas até hoje tal nunca aconteceu. Talvez porque seja impossível argumentar conta isto: É mais que sabido que, para a igreja, nós mulheres somos seres “do lar” (não vamos dizer inferiores, porque não é assim que eles o interpretam). Devemos ser recatadas, dedicadas à família, devemos ser o complemento que traz o equilíbrio ao marido (sim, porque para eles “nem pensar em termos uma mulher!”) e o auxilia nas decisões. Devemos cuidar da casa, dos filhos e do casamento. E, tal como disse o actual papa numa visita ao México, “não devemos preocupar-nos se de vez em quando voar um prato, porque todas as famílias discutem” (mesmo que o prato tenha tendência a cair na cabeça da mulher?). Ora, não é isto o total oposto dos ideais Feministas? Não defendemos nós que não estamos aqui para sermos apenas o auxílio de alguém? Não queremos nós poder escolher ser a personagem principal? Não defendemos nós, feministas, que família é amor e que não interessa o sexo de cada um dos membros do casal? Não defendemos, nós, feministas, a divisão das tarefas domésticas? E não defendemos nós, feministas, que nenhum prato deve “aterrar” na cabeça de nenhuma mulher?! Não dá. Podem até tentar dizer-me: “Sou católica, mas não concordo com os ideais que a igreja defende.” E aí responderei: “Ok, então acreditas em Deus, não és católica.” Não podemos dizer que somos católicos e não concordamos com os princípios base do catolicismo. Assim como não podemos dizer que somos de um clube mas que não torcemos por ele quando joga. Porque as religiões assentam em princípios e histórias. Elas existem através de contos, escrituras, testemunhos, testamentos. Todos escritos por homens. Todos conservadores. Todos machistas. Ambíguos, claro, de modo a serem propícios a várias interpretações. Mas nenhum que diga claramente: “Homens e Mulheres são iguais em direitos e deveres. Nenhum homem deve exercer a sua força sobre nenhuma mulher. Nenhuma mulher deve exercer a sua força sobre nenhum homem.”. Todos os contos nos cingem ao papel de esposa, de mãe, de submissa. Até a mais conhecida mulher referenciada pela religião católica (por cá, claro), Maria Madalena, surge errática, como pecadora, personagem a precisar de ser salva, em posição de inferioridade e de vítima. Dito isto, reafirmo: é realmente de árdua compreensão, que quem tenha em si o desejo real da igualdade entre Homens, Mulheres, Heterossexuais, Lésbicas, Gays, e todos os géneros, e transgéneros, se assuma como Católico. Ou de outra religião qualquer que se baseie em valores opressivos e preconceituosos. Porque não podemos dissociar as religiões dos desígnios que estas defendem. Admito que pessoas que foram educadas toda a sua vida em famílias e meios religiosos, não tenham facilidade em pôr em causa toda essa educação. Não só por lhes ter sido incutida por figuras que têm por credíveis, mas também por se terem habituado a apoiar-se na ideia de que as coisas não acontecem aleatoriamente, que faz tudo parte de um plano que lhes foi destinado. Todavia, se cada uma de vós, mulheres feministas e religiosas continuarem a refletir, a lutar pela liberdade, pela igualdade e, acima de tudo, pelo direito à felicidade, parece-me óbvio que a mudança terá de acontecer. Sei que deve ser difícil reaprender toda uma nova filosofia de vida assente em liberdade de escolha. Mas, feministas, não é precisamente nisso que nós acreditamos? Catarina Corvo - CAPAZES (crónicas) «http://capazes.pt/cronicas/a-religiao-mata-a-liberdade/view-all/» A Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Sintra, apresentou o relatório referente ao ano de 2015. Pode baixar o documento aqui. ![]()
Intervenção de Laborinho Lúcio Isto está cheio de patetas, as perguntas nunca são bem aquelas e as respostas também nunca são bem aquelas. Primeiro era uma boutade. Foi num almoço, estávamos a gozar, e de facto eu acho mesmo que ele teria sido melhor poeta se tivesse feito amor… Como se pode viver sem fazer amor ? Não entendo. António Lobo Antunes detesta a palavra "viral", fica arrepiado quando lhe fazem o gesto das aspas com dois dedinhos no ar. No seu último romance, Natureza dos Deuses, em que acompanha a ascensão e queda de uma família de banqueiros que prefere nunca nomear (o leitor se quiser pode adivinhar), Antunes vinga-se. Até da clareza, da cronologia clássica, dos cânones da sintaxe. A força torrencial da linguagem alaga tudo, num emaranhado de vozes, obsessivas mas nunca histéricas, quase sempre perplexas, que se sobrepõem, atropelam, sem querer saber do espaço e do tempo, num "delírio caótico". Como uma partitura musical, onde a melodia se perde e regressa ao refrão. Ou como um ecrã com várias janelas abertas, em que um leitor, ultraconcentrado, e com olhos de camaleão, assiste a tudo, em simultâneo. Logo ele que nem sabe abrir um computador (continua a escrever em caligrafia de formigueiro miniatural) e recusa o telemóvel. Porque, como dizia o (Umberto) Eco: "O telemóvel só serve a três classes de pessoas: os médicos ou os bombeiros; as pessoas portadoras de doenças, como diabetes; e os adúlteros."Costuma ser o escritor da marquise e do naperon, mas desta vez detém-se numa família de milionários. Porquê?
Como dizia Flaubert, "é preciso vasculhar toda a vida social para ser um verdadeiro romancista, visto que o romance é a história privada das nações". Vasculhou muito? Não, porque não sou do século dele. Os ricos do seu livro são tratados como sádicos na cama, que fazem das mulheres "os seus palhaços" e os empregados emprestam a mulher ao patrão… Eu assisti tanto a isso na vida real, sobretudo no mundo dos ricos. Homens a oferecerem as próprias mulheres. Fitzgerald dizia a Hemingway que os ricos eram uma "espécie diferente", e o Hemingway "pois são, têm mais dinheiro". Mas não é só isso… O desprezo? Não desprezam, ignoram… Aqueles a que eles chamam "as criaturas"… A ambição de poder sempre me assombrou. Eu só queria fazer livros bons. Onde se sentiu mais em casa: nos meios intelectuais, nos salões literários, na tropa, no hospital, quando era médico? Sei lá. Faz-me cada pergunta… Frequento pouco os meios literários… Mas é quando estou com pessoas de quem gosto. Passei a infância num bairro pobre que era Benfica. Estou muito ligado a essas pessoas. Mais do que supunha. Apanhei uma tuberculose porque passava os dias em casa do sapateiro e de uns vizinhos que nós tínhamos. Era gente muito pobre. A minha mãe dizia que tinha herdado isso do meu pai: só gostava dos pobres, mas sentia-me tão bem com eles. Quando ia para a Beira Alta e se tomava banho numa selha, era tão bom… Eu estava sempre a transbordar de ternura, ainda estou, só que escondo. Gosto de pessoas que tenham gostos diferentes de mim. Custa-me quando são do Sporting, mas enfim, ninguém é perfeito… Passou pela guerra, por três cancros, agora a morte de um irmão e da sua mãe… E reverteu muito do seu sofrimento para a escrita? A gente não inventa nada. Estes dois anos foram terríveis, e agora o cancro do meu irmão João, que aguenta tudo com uma dignidade, uma coragem, que eu sempre encontrei nos cancerosos, sem uma única queixa… Quando passei 19 dias no hospital lembrava-me do Proust, sempre a olhar para a janela à espera que fosse dia como se o dia me viesse salvar de alguma coisa, não me salvava de nada. Tenho passado muito. Mas começamos a relativizar muita coisa… Eu tenho uma ideia sobre o meu trabalho… Posso dizer em off? Preferia que dissesse em on… Eu acho que nunca ninguém escreveu como eu em Portugal. Mas é só uma opinião. Já atingiu um patamar em que pode escrever como bem entender e até dizer o que lhe apetece, sem se preocupar com as consequências? Está a pensar no Fernando Pessoa e de eu ter dito que ele não fodia? Por exemplo. Isto está cheio de patetas, as perguntas nunca são bem aquelas e as respostas também nunca são bem aquelas. Primeiro era uma boutade. Foi num almoço, estávamos a gozar, e de facto eu acho mesmo que ele teria sido melhor poeta se tivesse feito amor… Como se pode viver sem fazer amor ? Não entendo. Mas só um palerma é que me vai atacar por eu dizer isso. Mas não. Não houve medíocre que não viesse morder. Não gosto da Mensagem, é evidente, como acho que o Livro do Desassossego é um conjunto de banalidades e lugares-comuns. Não sei para que estamos a falar do Fernando Pessoa, coitado, não tem culpa nenhuma… Isto é para dar matéria aos idiotas, para me virem morder os calcanhares, não chegam mais alto… Pessoa e Eça são intocáveis? Pois, e isso é extraordinário. Achava Eça um romancista extraordinário, já não acho. Tenho admiração pelo Antero e pelo Herculano. O meu pai citava Herculano: “Por meia dúzia de moedas Garrett é capaz de todas as porcarias, menos de uma frase mal escrita.” Não é bonito? É. Era um foco de discussão entre mim e o Zé [Cardoso Pires], ele achava que o Herculano era um chato. O que se faz agora é muito fraco, nem no estrangeiro há grandes escritores. Os génios aparecem ciclicamente? Pois, aparecem assim por revoadas. O milagre do século XIX, a quantidade de génios… só na Rússia havia dez ao mesmo tempo… [desfia os nomes com pronúncia russa], como em França e em Inglaterra. Agora não há. No século XX: Faulkner, Hemingway, Proust, Céline, Fitzgerald. O Thomas Mann é bom, mas chateia-me. O Musil chateia-me… E o Joyce? Admiro a proeza, mas às vezes penso se não será a proeza pela proeza. O que encontra num livro bom? O charme. Qualquer coisa indefinível que certos livros têm, certos homens têm, certas mulheres têm. É que não é ser bom tecnicamente. Têm que ter charme, não sei explicar. É qualquer coisa que nos faz tornar no verso do Neruda, "como uma onda para a praia na tua direção vai o meu corpo". E depois como se racionaliza sobre emoções? Gosto porque gosto, porque era ele, porque era eu. As amizades são assim, como o amor. A gente conhece uma pessoa e fica amiga de infância. As minhas amizades foram sempre fulminantes, e depois duram para a vida, depois morrem antes de mim. É uma traição horrível um amigo morrer. No seu livro diz: "A velhice não é roubarem-nos o futuro, é terem-nos roubado o passado"… Tem a ver com a memória. E sem memória não há imaginação. Aquilo que as pessoas chamam imaginação não é mais do que a maneira como nós arranjamos e desarranjamos os acontecimentos da vida. Nada se inventa. Pode-se misturar as coisas, ou mostrar só metade, mas todos os livros falam da mesma coisa. E todos os escritores são uniformemente infelizes. Porque se fossem felizes não tinham necessidade de passar 16 horas por dia a escrever. Há uma dor com que se nasce… Os artistas sofrem muito. Não é uma pessoa alegre? Conhece pessoas alegres? Conheço. Do seu livro, também: "Este atraso mental das pessoas felizes que dá vontade de corrigir ao estalo, o que vale é que passa depressa." Isso é alguém a falar lá dentro. Não tenho de subscrever isso [risos]. As taxas de suicídio entre os humoristas são muito grandes… Um sorriso é a tal lágrima entre parêntesis. Já o vi a dançar, a cantar alto, pareceu-me feliz… Estava a fazer muita cerimónia. É tão raro não haver inveja neste meio. No mundo provinciano, pequeno e saloio como é o meio literário em Portugal. Há muito poucas pessoas que me possam interessar e respeitar aqui. Tirando o Eduardo Lourenço. Rimo-nos imenso, ele tem muito humor. O Zé também, mas havia nele sempre uma amargura. Uma vez disse que ninguém podia fazer um bom livro antes dos 24… Ai, isso também gerou polémica? Um bocadinho. É verdade, não se pode escrever um bom romance antes de ter vivido. Poesia pode ser. Olhe, eu com essa idade só escrevia merda. Nunca tive pressa em publicar. Essa qualidade eu tenho. Não percebo porque isso causa polémica… mas cada vez que abro a boca… Mas não faz de propósito? Claro que não. Agora tudo tremelica. Há para aí umas criaturas, por causa das relações sexuais e poesias, ficaram insultuosos. Não era nada disso, aquilo passou-se num contexto diferente, quero lá saber se o homem fodeu ou não… Tem teorias acerca disso? Tenho lá… Olhe a Santa Teresa d’Ávila… Também era virgem. Não sei o que é pior, se isso, se aturar um homem… Deve ser terrível. Os homens não merecem as mulheres, reduzem tudo à genitalidade. Quando lhes deveria dar muito mais prazer estar sentado no sofá, de mãos dadas, a ver uma novela, do que um em cima do outro a esbracejar. O verdadeiro prazer vem do amor, que é uma coisa em que ninguém é bom, ninguém é mau. Tive de fazer muita sexologia… E o medo que os homens têm das mulheres? E como nós, homens, ligamos tudo à potência… Já comeste aquela gaja, e esta, e a outra? Nunca entrou nesse registo? Provavelmente entrei, não sou melhor que os outros. E no fundo os homens andam sempre à procura de uma outra coisa, andam tão perdidos como elas, querem ser amados, querem ser protegidos, gostados. Temos a ilusão de que assim afastamos a morte, porque ninguém está preparado para morrer. Houve um cirurgião que lhe agarrou a mão durante a anestesia… Foi um ato de amor, nem imagina como foi importante para mim. Há mãos de homem que apertam bem. As mulheres são muito mais exigentes. "O que fizeste da tua irmã gémea que abandonaste ao nascer?" Se os homens conseguissem não abandonar a irmã gémea ao nascer… O sexo não é o mais importante numa relação. A gente entrar um no outro numa relação, sem precisar de recorrer a esse apêndice. Eu já não sou um homem bonito. Dá assim tanta importância a isso? Ai, eu gostava de ser bonito. Fazer uma cara sorrir para mim. Mas sob esse aspeto convivo bem comigo. O meu medo é começar a escrever porcarias e não ter consciência disso, o Simenon chegou aos 70 e, como ele dizia, resolveu partir o lápis. Continua a ler muito? Claro. Olhe, o primeiro livro que me fez chorar foi o Love Story [de Erich Segal], emprestado por um sargento, na guerra. Chorei como uma Madalena. Porque todos nós temos uma criada de servir cá dentro, no sentido antigo da palavra. Todos nós somos muito pirosos. Mas ainda lê os livros que a criada de servir que tem dentro de si lhe pede? Às vezes, não sei se são bons ou maus. Um meu editor francês citava muitas vezes a frase de um general veneziano do século XVI: "É preciso agarrar a oportunidade pelos cabelos, mas não esquecer que ela é careca.” A gente a escrever é assim, eu sinto-me um pobre… Gosto muito de ler, é um prazer enorme. O meu pai estimulou muito a leitura aos filhos e a minha mãe deve ser a única mulher que eu conheço que leu o Proust duas vezes. Porque não disse a "única pessoa"? Dito assim pode parecer um comentário misógino... Acha que eu falo mal das mulheres? Deus me livre. Isso era dantes, não era? Eu devo tanto às mulheres, à minha avó, à minha mãe… Estava aqui sozinho, a escrever, e de repente sai-me, sem eu dar conta, um berro: "Quero a minha mãe!" Todos os homens quando estão aflitos querem a mãe, tenham a idade que tiverem. Vi morrer tanta gente nos hospitais e nunca vi um homem chamar pelo pai. É espantoso. Velhos e doentes com mais de cem anos: "quero a minha mãezinha". Com mais de cem anos continuam a chamar pela mãe. É extraordinário. Mas uma coisa são ‘as mulheres’, outra as nossas mães, irmãs… Não tenho ideia de as tratar mal. Só tenho filhas, as pessoas que mais me marcaram foram todas mulheres, como é que eu poderia? O livro que estou a escrever agora anda todo à roda de uma mulher com Alzheimer, é também um desafio técnico, como é que eu vou descrever uma mulher que vai perdendo a memória? Sinto-me mais à vontade com mulheres. Ou então são elas que vêm ter comigo nos meus livros, sentam-se à boca de cena e começam a falar. Dá ideia de que tem um ouvido absoluto para captar as marcas de oralidade, mas também repara tanto nos detalhes, nos pequenos pormenores… Também deve ter um espécie de olhar absoluto… É só trabalho. Sou capaz, sem olhar para si, de dizer como está vestida, de cima abaixo. Se se tiver aberto aos outros, as coisas entram dentro de nós. E as pessoas são tão interessantes, mas depois há os chatos. Fala dos políticos? Fui infeliz durante este governo de direita, os erros, a maneira de falar, a arrogância, a ambição social que se notava naquela gente toda, e nos tipos que estão por detrás… É uma chatice, os alfaiates mudaram isto, porque dantes percebia-se quem eram as pessoas com dinheiro, agora vestem-se todos de igual. Ficou contente com o acordo da esquerda? Então não fiquei? Não pertenço a nenhum partido, mas estou mais à esquerda do partido socialista. Mas isso também não é importante: o pai do meu pai era conservador, salazarista, monárquico e era a pessoa mais democrata, bondosa e tolerante que eu conheci. Continuo a simpatizar com o Louçã. Gostei do Álvaro [Cunhal], era um homem irresistível, exceto quando se punha a falar de política, aí era impossível. Mas a falar de Bruegel era fascinante. A Catarina Martins tem uma inteligência cândida, que é uma coisa de que eu gosto. Uma cara, um ar e convicção que me é agradável. Parece-me a mim pureza. Oxalá não esteja enganado. Entrevista a Lobo Antunes Ana Margarida de Carvalho - VISÃO Toda a gente fala de direitos humanos e ninguém de deveres, talvez fosse uma boa ideia inventar um Dia dos Deveres Humanos. Um projeto de INCLUSÃO para todos os cidadãos, no dia da Língua Gestual. Uma iniciativa única, de um músico português, para que a música seja sentida por todos, já que É PARA TODOS... Realiza-se em Sintra, nos dias 20 e 21 de novembro o ETerna Biblioteca, 13.º Encontro de Professores e Educadores do Concelho de Sintra sobre Bibliotecas Escolares. Programa ![]()
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