O desenvolvimento do capitalismo industrial promoveu uma separação entre o espaço e o lugar que está na origem da "desterritorialização", quer da economia, quer da vida social, inserindo-a num espaço mais vasto e tendencialmente visto como homogéneo, correspondente ao território do Estado-nação.É este processo de "desincerção das relações sociais dos contextos locais de interação" que deixam de determinar uma pertença a um espaço físico e nos conduzem a uma crescente "desterritorialização das nossas vidas". Hoje, em contraponto à mundialização da economia, estamos a assistir a um processo de sentido inverso (que não anula, antes complementa o primeiro) de “reimplantação do laço social ao nível do território”. É neste quadro que é possível inserir a atual revalorização do “local”, como temática económica, social e política. Numa época cada vez mais dominada por conexões superficiais, por horizontes de curto prazo e por uma racionalidade mercantil, a revalorização do local pode exprimir a tentativa de “recriar reservas de confiança e de capital social”, fundada na convicção de que a “geografia existe e que a cultura conta”.
A escola é tributária e participou das mudanças que historicamente marcaram a passagem das sociedades em rotura com o território. No atual contexto o debate e as práticas são hoje marcados pela referência a uma necessária recontextualização da ação educativa escolar que trouxe para primeiro plano o debate sobre as relações entre a escola e o local. AUTONOMIA DA ESCOLA O crescimento exponencial dos sistemas escolares, na segunda metade do século XX, colocou problemas de regulação interna muito complexos em razão do “gigantismo” assumido pelos sistemas escolares. Este tipo de transformações, de natureza mais conjuntural, coexistiu com transformações estruturais e de longo prazo relacionadas com as modificações do Estado (declínio do Estado-nação) e da Escola que sofre a desinstitucionalização. Estas duas razões contribuem, de forma acentuada, para modificar as relações da escola com o local, tornando-a mais dependente do contexto e mais liberta do controlo imediato exercido pelo Estado educador. O desenvolvimento local, entendido como um processo de inovação capaz de produzir importantes transformações sociais, afirma-se em pararlelo com o progressivo descrédito de processos de gestão planificada central que foram dominantes quer na economia, quer na educação. A educação, nomeadamente a educação escolar, enquanto domínio de intervenção social, emerge como uma das dimensões fundamentais de políticas e projetos de desenvolvimento local, concebidos de forma integrada e baseados na endogeneidade dos recursos, o que implica o apelo a metodologias de carater participativo. A defesa da articulação da escola com a comunidade local, corresponde a uma mudança de perspetiva, a uma rutura com a ideia do fechamento da escola sobre si própria. Do ponto de vista pedagógico, a interação com a comunidade induz a uma outra forma de encarar os alunos, de valorizar a sua experiência, os seus saberes, encarando-os como a “comunidade dentro da escola”. Nem o problema se esgota nas organizações escolares, nem os problemas da escola podem ser resolvidos pensando, exclusivamente, em termos de educação escolar. É uma perspetiva de educação pensada de uma forma globalizada, no quadro de um território (físico e social) que nos permite passar de uma abordagem analítica e segmentada para uma abordagem articulada e interativa das varias dimensões de cada “feixe de problemas”. Deixou de ser pertinente pensar e agir isoladamente num problema como a alfabetização, sem articular, a nível territorial, políticas e vetores de ação que apelam a uma intervenção integrada e que têm a ver com o sistema escolar, com a educação de adultos, com a inserção profissional dos jovens, com a criação de emprego, a competência parental, com a educação não formal, etc. Esta perspetiva integrada da ação implica pensar em termos de territórios educadores (e não em territórios escolares) e constitui uma condição necessária para criar uma maior pertinência da ação educativa e, portanto, um acréscimo de legitimidade social, em relação a contextos e públicos que são singulares. Caminhar na construção global desta ação educativa supõe a capacidade de evoluir de uma conceção meramente “pedagógica” de “abertura” da escola ao contexto local para uma ação deliberada e concertada de diferentes parceiros, fortes e autónomos a nível local: escolas, autarquias, associações locais, centros de formação profissional, bibliotecas públicas e museus, etc. Ao nível local, confrontam-se diferentes lógicas de ação a que só as próprias instituições e os seus atores locais estão em condições de dar um sentido e uma coerência.
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