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Especialista nos direitos das crianças e mediação familiar estudou o impacto do divórcio nas famílias e na relação dos pais com as crianças Edward Kruk é presidente do Conselho Internacional da Parentalidade Partilhada e professor na Universidade British Columbia (Canadá). Investigador em Ciências Sociais e especialista nos direitos das crianças e mediação familiar, está em Portugal para participar na V Conferência Internacional Igualdade Parental Século XXI, hoje e amanhã, em Santarém.
Porque é que muitos homens deixam de ter contacto com os filhos após o divórcio? O meu primeiro trabalho, em 1985, foi sobre o impacto do divórcio quando não há guarda partilhada dos filhos e, precisamente, para perceber a razão pela qual tantos pais perdiam o contacto com as crianças. Dizia-se, nessa altura, que era porque não estavam interessados. Entrevistei cem homens, no Reino Unido e no Canadá, pais que perderam o contacto com os filhos e pais que mantiveram esse contacto. Fiquei surpreendido com algumas conclusões. O que é que mais o surpreendeu? Que os pais mais tradicionais, que estão menos envolvidos com a educação das crianças no pré-divórcio são os que mais facilmente se adaptam à separação e que mantém o contacto, mesmo sendo esporádico. Enquanto os pais que têm um maior envolvimento no acompanhamento das crianças antes da separação são os que mais dificilmente ultrapassam o divórcio e mais facilmente perdem o contacto com os filhos. Mas a primeira conclusão é que todos sofrem com a separação pelo facto de perderem o contacto diário com as crianças. A segunda é que há uma grande descontinuidade na relação pai/filho entre a fase pré e pós-divórcio. Parece uma contradição. Eu próprio esperava o contrário, que os pais mais envolvidos mantivessem maior ligação. Mas os que estão mais envolvidos, do ponto de vista emocional e psicológico, querem estar mais tempo com os filhos e lutar por isso, existindo uma maior probabilidade de perderem o contacto. Está assumido que as crianças ficam melhor com as mães e os pais têm muitos advogados a dizer-lhes que não têm hipóteses. Finalmente, conclui que há uma combinação de fatores estruturais, tanto no sistema legal como na resposta psicológica dos pais, mas dizer que estes não estão interessados é um estereótipo que não correspondem à verdade, isto em 1985. E agora? Fiz a mesma investigação 20 anos depois, desta vez apenas no Canadá. Conclui que os homens estão cada vez mais envolvidos no acompanhamento das crianças, o que complica as coisas. Complica? Sim, porque os tribunais continuam a ter uma prática que privilegia as mães em detrimento dos pais, isso não mudou significativamente. O que mudou foi a sociedade e o envolvimento dos homens, estão mais empenhados na educação e no cuidar das crianças, também porque as mães trabalham fora de casa, muito mais do que há 10/20 anos. Uma grande mudança é que toda a família trabalha fora de casa, é normal a mãe trabalhar e o pai cuidar da criança. Os pais têm uma relação forte com os filhos e querem manter essa relação, o que não se conseguem com as visitas ao fim de semana. Qual deverá ser a abordagem? Nos últimos dez anos tenho estudado as determinações legais após o divórcio, olhar para as diferentes possibilidades aplicadas pelo sistema judicial e as responsabilidades parentais partilhadas. A abordagem que se deve fazer é no sentido do interesse da criança, das suas necessidades, porque há fatores que ajudam uma criança num processo de divórcio e o mais importante é que esta mantenha os laços, as rotinas, as relações estreitas com o pai e com a mãe, As crianças precisam de ambos os pais. Os juízes justificam, muitas vezes, a entrega da custódia a um dos progenitores até para evitar conflitos. O que provoca é o contrário. Obviamente, que não estou a falar nas situações de conflitos extremos ou de violência doméstica, mas há uma maior probabilidade de existirem conflitos quando o pai e a mãe não partilham as responsabilidades parentais. Estes tendem a aumentar quando apenas um dos pais tem a custódia, há sempre a tentativa de se provar qual é o melhor pai, o que não é benéfico para a criança. Quando as crianças passam tempo igual com o pai e com a mãe, quando têm uma relação forte com ambos, estes protegem-na das situações de conflito e que pode existir na fase inicial do divórcio. Na perspetiva das crianças, e por várias razões, é melhor passarem tempo igual na casa da mãe e na do pai. Falou com as crianças? Também falei com as crianças, mas sobretudo porque nos últimos dez anos realizaram-se uma cinquentena de estudos comparando a situação das crianças cuja custódia foi entregue à mãe ou ao pai e na custódia partilhada. E todos estes estudos, em diferentes áreas e com diferentes metodologias, demonstram que a residência alternada é significativamente melhor para as crianças. A sociedade mudou muito? Mantém-se algumas evidências da investigação de 1985 mas a sociedade está em mudança e no sentido positivo, reconhece que o pai tem de ter um papel igual ao da mãe. Nos anos 80 do século passado ninguém falava do pai cuidador após a separação, não havia essa possibilidade. Agora, quando se questionam as pessoas sobre a partilha das responsabilidades parentais, 80% das mães e dos pais, talvez mais mães do que pais, respondem que a coparentalidade é a melhor opção. E, quando se questionam jovens adultos, filhos de casais divorciados, dizem que a residência alternada, tempo igual com a mãe e com o pai, é o melhor para eles, dizem que precisam de ambos os pais. O sistema judicial está a mudar à mesma velocidade? Não. Os homens são discriminados? Não é uma discriminação dos homens, é uma discriminação das crianças de famílias divorciados e contra a Convenção sobre os Direitos da Criança. Um juiz não pode tirar o pai ou a mãe da vida de uma criança, mas pode deixá-la ao cuidado de apenas uma mãe ou um pai numa situação de divórcio, isto é discriminação contra as crianças. Num casal não se pode anular a presença de um dos pais, a não ser que existam fortes razões como em casos de abusos, de negligência, violência, e nas famílias divorciadas facilmente se tira um destes elementos. Justificam-se muitas decisões, sobretudo nos tribunais, tendo em vista o superior interesse da criança. Isso não é verdade, é nonsense. Esse conceito depende da ideia que o juiz tem e cada juiz tem uma ideia. Os juízes não estão habituados a lidar com crianças ou têm conhecimentos da dinâmica familiar para perceber qual é o interesse da criança. Esse é um conceito muito complexo, além de que apela a estereótipos. Quando se questiona a criança, o que dizem é que querem estar com ambos os pais. Há aqui um conflito de género. Não. Também investiguei o impacto do divórcio nas mulheres, sobretudo as que não ficaram com a custódia dos filhos. Têm os mesmos problemas que os homens, sentem-se envergonhadas, humilhadas, tal como os pais que não ficam com a custódia. Quais são as diferenças entre os países? Nos EUA e, cada vez mais no Canadá, o sistema legal é dominante e veem o divórcio como uma oportunidade para criar rendimentos, 40% do tempo dos tribunais canadianos é gasto com as questões familiares, com a custódia das crianças. Nos países escandinavos, Bélgica, Holanda, especialmente a Suécia, em muitos países europeus mas também na Austrália, a guarda partilhada é a norma. Portugal penso que é mais tradicional, mas as coisas também estão a mudar. Céu Neves - DN «http://www.dn.pt/sociedade/interior/pais-mais-envolvidos-mais-facilmente-perdem-contacto-com-os-filhos-5201192.html»
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Há uns anos entrevistei várias mulheres no âmbito de um projeto de investigação sobre modalidades de conciliação da vida profissional com a vida privada. Do guião fazia parte a seguinte pergunta: “O seu marido ajuda-a em casa?”. Ainda hoje recordo uma resposta que achei genial: “Ajuda-me em casa!? Não! Em minha casa existe partilha. Ajudava-me se me lavasse os dentes ou se me vestisse. A casa é dos dois. As tarefas são dos dois!”
Trata-se realmente de uma expressão comum e que pressupõe, neste caso, que a tarefa de cuidar do lar é atribuída a um dos elementos do casal e que o outro generosamente coopera. Partilhar não significa identificar uma ou duas atividades e nomear a outra pessoa responsável. Não se trata de dizer “tu fazes as compras e cozinhas” e “eu lavo, estendo, dobro e arrumo a roupa, ponho a loiça na máquina, varro, aspiro e lavo o chão, ponho e levanto a mesa, faço a cama, limpo o pó a todas as divisões, sacudo as carpetes, lavo janelas e paredes, limpo os vidros, limpo o frigorífico e o fogão, troco as toalhas de banho e a roupa de cama, recolho os objetos espalhados pela casa, organizo o sótão, a dispensa, a roupa para doar, rego as plantas…” Partilhar é sentir o lar como um projeto do casal que deve ser gerido e cuidado com vista ao bem-estar e ao conforto da família. A negociação da distribuição das responsabilidades domésticas é uma das muitas dinâmicas que deve ser incluída na rotina do casal e que deverá contrariar espaços desiguais em desfavor de um dos elementos. Como diz Caetano Veloso “quando a gente gosta é claro que a gente cuida” um pensamento que deve contrariar a conveniência, a preguiça ou até mesmo o egoísmo. Os indicadores estatísticos demonstram que, ainda hoje, muitos homens se escudam nos papéis sociais tradicionalmente atribuídos ao género. Todavia, também muitas mulheres cumprem esse papel, encarando a esfera privada como um domínio que é delas ou como um “fardo” difícil de romper. Não irei aqui refletir sobre os fatores que estão na base desta questão. Aliás, seria difícil fazê-lo sem abordar contributos empíricos que desenvolvem e ilustram este tema. Parece um assunto simples, mas que está totalmente associado à divisão sexual do trabalho, tendo implicações diretas na gestão da conciliação e nas carreiras profissionais de homens e de mulheres. Não poderemos ainda esquecer que ao tempo necessário para a realização das tarefas domésticas acrescem as restantes responsabilidades familiares, sobretudo, os cuidados com crianças e adultos e, ainda, o conjunto de horas semanais dedicadas ao trabalho pago. Certamente será mais fácil (e justo) se todas as pessoas estiverem envolvidas e comprometidas. Deste modo, não considero que a partilha seja uma questão de sorte, porque estes homens são especiais e diferenciadores mas, pelo contrário, considero que os casais que não beneficiam dela, esses sim, têm azar! Com a partilha evitam-se conflitos e ganha-se mais tempo para a relação e para a família. Deve ser encarada como algo necessário e que simplesmente tem que ser feita! Joana Correia dos Santos - CAPAZES «http://capazes.pt/cronicas/o-meu-marido-ajuda-me-em-casa/view-all/» Vivemos em uma sociedade altamente competitiva em que parece que nada é suficiente. Temos a sensação de que se não colocarmos bateria nos filhos eles terminarão atrás, sendo barrados pelos melhores do que ele.
Por isso, não é estranho que nas últimas décadas muitos pais assumiram um modelo de educação sustentado na hiperpaternidade (pais helicópteros que não se cansam de voar sobre seus filhos, incessantemente). Trata-se de pais que desejam que seus filhos estejam preparados para a vida, mas não é no sentido da sorte do destino de cada um. É mais restrito: querem que seus filhos tenham o conhecimento e as habilidades necessárias para se realizar em uma boa profissão, conquistar um bom trabalho e ganhar o suficiente. Estes pais traçam uma meta: querem que seus filhos sejam os melhores. Para conseguir, não duvidam em apontar-lhes diversas atividades extraescolares, preparar o caminho até aos limites inacreditáveis e, por hipótese, conquistar o êxito a qualquer peço. E o pior de tudo é que creem que o fazem “por seu bem”. O principal problema deste modelo de educação dos filhos é a pressão desnecessária sobre os pequenos, uma pressão que termina tirando-lhes sua infância e esta atitude cria adultos emocionalmente fracos. Os perigos de empurrar os filhos ao êxito A maioria dos filhos são obedientes e podem alcançar os resultados que seus pais lhes pedem. Se as deixaram agir sozinhos serão capazes de conduzir seu pensamento autônomo e as habilidades naturais podem conduzi-los ao êxito verdadeiro. Se não lhes damos espaço e liberdade no seu próprio caminho quando lhes enchemos de expectativas, o filho não poderá tomar suas próprias decisões, experimentar e desenvolver sua personalidade. Pretender que os filhos sejam sempre melhores traz grandes perigos Gera uma pressão desnecessária que lhes retira a infância. A infância é um período de aprendizagem, mas também de alegria e diversão. Os filhos devem aprender de maneira divertida, devem errar, perder o tempo, deixar voar a sua imaginação e passar seu tempo com outras crianças. Esperar que as crianças sejam “os melhores” em determinada área – colocando sobre eles expectativas muito elevadas – somente fará que suas frágeis rótulas se dobrem ante o peso de uma pressão que não necessitam. Esta forma de educar termina arrebatando-lhes a sua infância. Provoca a perda da motivação essencial e o prazer Quando os pais se concentram mais nos resultados que no esforço, a criança perderá a motivação essencial porque compreenderá que conta mais o resultado que o caminho que está seguindo. Portanto, aumentam as possibilidades de que cometa fraude no colégio. Por exemplo, verá que não é tão importante que aprenda se a nota for boa. Da mesma maneira, vai concentrar-se nos resultados, e vai perder o interesse pelo caminho, e deixa de aproveitá-lo. A semente do medo e do fracasso O medo ao fracasso é uma das sensações mais limitadoras que podemos experimentar. E esta sensação está intimamente vinculada com a concepção que temos sobre o êxito. Portanto, empurrar as crianças desde cedo ao êxito desde pequenininho só serve para plantas neles a semente do medo ao fracasso. Como consequência, é provável que estes pequenos não se tornem adultos independentes e empreendedores, como querem seus pais. Serão pessoas que preferem a mediocridade somente porque têm medo de fracassar. A perda da autoestima Muitas das pessoas mais exitosas, profissionalmente falando, não são seguras de si. De fato, muitas supermodelos, por exemplo, dizem que estão feias e gordas, quando na realidade são ícones de beleza. Isto acontece porque o nível de perfeccionismo a que sempre são submetidas. Elas acreditam que nunca estarão em forma e que um pequeno erro na dieta será motivo para que as outras as vejam diferentes. As crianças que crescem com esta ideia se convertem em adultos inseguros, com uma baixa autoestima, e acreditam que não são suficientemente boas para serem amadas. Como resultado, vivem dependentes das opiniões dos outros. O que realmente deve saber uma criança? As crianças não necessitam de ser as melhores, somente necessitam ser felizes. Por isso, deve assegurar-se de que seu filho perceba: – Que é amado de forma incondicional e em todos os momentos; sem importar os erros que cometa. – Que está a salvo, que lhe protegerá, e a apoiará sempre que precisar. – Que pode fazer tolices, perder o tempo fantasiando e brincando com seus amigos. -Que pode fazer o que mais gosta e dedicar-se a essa paixão, sem importar de que se trata. Que pode passar o seu tempo livre pintando flores coloridas ou pintando gatos com seis patas se é o que lhe dá alegria, em vez de praticar a fonética e o cálculo. -Que é uma pessoa especial e maravilhosa, igual a muitas outras pessoas no mundo. -Que merece respeito e que deve respeitar os direitos dos demais. E o que deve fazer os pais? Também é fundamental que os pais percebam: – Que cada criança aprende no seu próprio ritmo, e não devem confundir o estímulo que desenvolve com a pressão que sufoca. Texto da psicologa Jennifer Delgado (Tradução livre) «http://www.portalraizes.com/criancas-precisam-ser-felizes-nao-de-serem-as-melhores/» |