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Já está disponível o relatório Education at a Glance 2015, da OCDE. Portugal, em alguns indicadores, ainda se encontra longe da média dos trinta e quatro países que compoem a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico. No entanto, em termos globais, tem vindo a recuperar. Se não vejamos alguns dados, a título de exemplo: — O nosso país encontra-se a sete posições da cauda da estatística entre os países onde o número de jovens adultos, entre os 25 e os 34 anos, não concluiu os estudos secundários (entre 30 a 40% desta população). Portugal constitui ainda um dos países em que o número de homens sem o ensino secundário completo é superior ao das mulheres. — Mais de 70% da população com 55-64 anos não concluiu os estudos secundários. — Em compensação, enquanto a maioria da população dos países da OCDE com qualificação a nível superior tem apenas uma licenciatura, em Portugal mais de 75% desta população tem um mestrado ou pós-graduação. A maioria são mulheres. — Do lado oposto, Portugal está entre os os países com menos formandos de cursos vocacionais nos estudos secundários ou pós-secundários não-superiores (cerca de 20%, dos 25 aos 64 anos, enquanto a média ultrapassa os 40%. Na República Checa esta percentagem sobe aos 70%). — As tendências são positivas no que toca aos alunos a estudar no ensino secundário entre 2005 e 2013: em Portugal a percentagem subiu substancialmente, enquanto por exemplo, na Noruega desceram. Também a formação vocacional tem estado em fase de ascensão (mais de 50%), tendo já ultrapassado a média da OCDE (mais de 40%). No entanto, a educação vocacional ainda é desvalorizada em termos de emprego, ao contrário de países como a Dinamarca no qual a taxa de desemprego é menor nos indivíduos vocacionalmente qualificados em comparação com os que têm estudos gerais. — A maioria das graduações em território nacional são nos campos das Ciências Sociais, Económicos e da Advocacia. — Em termos gerais, o desemprego é maior entre indivíduos com menos estudos (secundário) relativamente àqueles que têm formação superior. — Portugal foi ainda um dos países que mais reduziu a despesa pública com instituições educativas neste período, em consequência da recessão económica que o país atravessou.. Estes e outros dados relevantes podem ser observados no relatório que aqui se publica na íntegra (em inglês).
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Luna tem 12 anos, Maira tem 11. Cresceram com duas mães, mas até agora não as tinham reconhecidas no cartão de cidadão. Esta sexta-feira, Luna esteve na Assembleia da República e aplaudiu a aprovação da lei de adoção por casais homossexuais. Pela sua família, pelas suas mães Luna, um rapaz de 12 anos, chegou preocupado e saiu radiante das galerias da Assembleia da República. Ouviu. Questionou. E aplaudiu a decisão dos deputados. Finalmente chegara o dia que há tanto sonhava. Pedira à mãe Fabíola para o acompanhar, sabia que ia ser um dia decisivo e fez questão de estar presente. Ia assistir à votação da lei, a tal lei que permitiria reconhecer legalmente a sua família. Luna e a sua irmã Maira, de 11 anos, cresceram com duas mães, reconhecem-nas assim, mas apenas Fabíola Neto tinha até agora direitos legais sobre eles, por ser a mãe biológica por via da inseminação artificial. Ana Prata, a outra mãe com quem sempre cresceram e têm a mesma relação de amor e afeto, não era reconhecida pelo Estado como tutora das crianças.No ano passado, Luna saíra desalentado das galerias com a irmã depois de ver chumbada a aprovação da lei por casais do mesmo sexo. E, na altura, dissera ao Expresso que não percebia a razão de tanta confusão e dificuldade para reconhecerem o facto de ter uma família diferente da maioria. E garantira-nos que nunca se sentira gozado pelo facto de ter duas mães e que não achava estranha a sua família. Era a sua, era muito amado, e bastava. "Não sei como seria ter um pai, mas é bom ter duas mães", dizia na altura - na mão tinha “Ulisses”, a adaptação de Maria Alberta Menéres do clássico de Homero, que trouxera para se entreter. "Mãe, este é dos nossos" Tal como no ano passado, este ano assistiu a toda a discussão com muita atenção e em silêncio. Até ao momento que ouviu um deputado do CDS a falar dos "superiores interesses da criança". Luna olha para a mãe e segreda-lhe: "Mãe, este é dos nossos. Ele defende esta lei, não é?" Fabíola sorriu e respondeu-lhe que não. Que na opinião desse senhor deputado o melhor para as crianças não era esta lei... "Mas mãe, não! Não. O meu interesse é que aprovem a lei. Eu quero que aprovem a lei. O que estão a dizer não é verdade. Como é que podem mentir?" Luna estava incrédulo na sua inocência de criança. Como seria possível quererem o melhor para si, mas não quererem aceitar as suas duas mães que tanto amava? Mas a aprovação acalmou-o. E juntou-se logo à irmã e à mãe Ana para celebrarem juntos o resultado durante o almoço em Santarém, onde vivem. Conversaram. Brincaram. Em família. Tudo certo. Este é um momento particularmente importante para os quatro. Ainda mais por terem passado recentemente por episódios particularmente dramáticos, dado que Fabíola foi diagnosticada há um ano e meio com um carcinoma invasivo na mama, facto que a obrigou a uma mastectomia, a dois internamentos e a tratamentos de quimioterapia. Desde aí confrontou-se com a situação frágil, delicada e desprotegida dos seus dois filhos. "O que teria acontecido aos meus filhos se eu eu tivesse morrido na mesa de operações?" Enquanto Fabíola esteve internada, a outra mãe, Ana Prata, não pôde tirar uma licença de apoio à família por não ser reconhecida como tutora. "Teve de contar com a boa vontade do patronato para se ausentar do trabalho. Mas esse direto deveria estar legalizado. Sem favores." Para mais, Fabíola e Ana já não são companheiras, a sua relação amorosa terminou após dez anos juntas, mas continuam amigas e nunca deixaram de educar e zelar pela saúde dos seus dois filhos. "Um compromisso de amor para a vida." Como qualquer outro casal divorciado com filhos. Fabíola sente este dia como um enorme alívio e uma vitória. Para a sua família e para a sociedade. "Este dia foi um dia muito importante. Significativo. Simbólico. Neste momento, Portugal está menos preconceituoso, mais realista, a defender melhor todos os seus cidadãos e todas as suas famílias." Sobre as opiniões que consideram que esta aprovação foi uma decisão errada, precipitada e criada à pressa por esta nova esquerda, responde: "Nós existimos de facto. Somos a prova de que este assunto não é uma invenção repentina da esquerda, mas uma realidade crescente na nossa sociedade e muitas outras. O meu filho faz para a semana 13 anos e sempre foi criado por duas mães. Ele e a irmã são um exemplo de que como esta lei era essencial e urgente para terem os direitos de qualquer outra família. Sempre fomos uma família de amor, de afeto, com responsabilidades económicas e problemas quotidianos como qualquer outra, sem que essa realidade fosse reconhecida até agora pelo Estado português. A partir desta sexta-feira termina uma discriminação que desprotegia e vulnerabilizava a nossa família, particularmente as nossas crianças." Fabíola, professora e ativista há 20 anos pelos direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgéneros, defende que esta mudança vem alargar o conceito de família e de uma sociedade mais rica e diversa. "A lei aproxima-se mais de uma realidade existente na sociedade, sem prejudicar ninguém. Passamos a defender as famílias na sua diversidade. E digo mais: esta aprovação da lei é o fim do último reduto de conservadorismo. Porque é claro que ser homossexual é tão normal e saudável como ser heterossexual e a parentalidade em nada é alterada por isso." TUDO ANALISADO E AVALIADO, COMO DEVE SER
Há muito que Miguel, de 9 anos, perguntava ao pai Jorge Correia, 43 anos, fotojornalista, quando é que passava a ter o nome do pai Pedro. E esta sexta-feira, ao fim do dia, Jorge pôde dizer ao filho "já podemos, já podemos, vamos meter os papéis para o pai Pedro ter direitos legais sobre ti e passares a ter o seu apelido". E um sorriso radiante é partilhado por todos. Parece um detalhe sem importância para uma criança ver o seu nome ganhar mais um apelido. Mas não. "É mais uma prova de segurança que ele sente, a mostrar que estaremos com ele para sempre. Porque ele já se separou uma vez da família biológica." Foi aos 4 anos que Miguel passou a viver com dois pais. Jorge candidatou-se a uma adoção monoparental e até agora era o pai legítimo perante a lei. "Na escola, na família, no trabalho, a nossa família era assumida e aceite. Nunca tivemos problemas de discriminação. A sociedade está mais do que habituada a famílias como a nossa. O que não estava adaptado à nossa sociedade era a lei. Era uma questão de timing político. E de bom senso. E ele chegou." Jorge recorda que este processo de coadoção por parte do companheiro Pedro não será imediato. "Tratando-se de crianças e da salvaguarda do seu interesse, não basta ir à Loja do Cidadão mudar apelidos. Agora o Pedro tem que passar por um processo de candidatura e de entrevistas feitas pela segurança social. Em que será analisado se o Pedro está apto para cuidar de uma criança e o vínculo familiar e afetivo que tem com ela. Será tudo analisado e avaliado. Como deve ser. Estamos felizes. A longa espera acabou". Bernardo Mendonça EXPRESSO «http://expresso.sapo.pt/sociedade/2015-11-20-Nao-sei-como-seria-ter-um-pai-mas-e-bom-ter-duas-maes» Cada criança é uma semente de futuro e cabe a nós, crescidos, oferecer-lhes um solo fértil e nutritivo que lhes permita tornarem-se adultos equilibrados e felizes (20 de novembro, Dia Internacional dos Direitos da Criança). Por Alexandra Rosa, psicóloga, Fale Connosco – Saúde Personalizada Um lar, colo, beijinhos e cócegas, abraços apertados, cavalitas e cambalhotas. Pais e mães que se sentam no chão, brincam com plasticinas, fazem vozes engraçadas e não têm medo de se sujar. Pais e mães com paciência, que deixaram o trabalho e as ralações fora de casa, escutam, entendem e param o mundo para simplesmente as amar. Um lar com afetos mas também com regras, com ralhetes mas sem berros. Ajudas nos trabalhos de casa, aconchegos na hora de dormir, livros declamados na pontinha da cama e monstros expulsos do quarto porque têm que ir sonhar. Cenouras e brócolos no prato, a carne e o peixe, a sopa quentinha e a fruta descascada a rivalizarem com o bolo de chocolate da avó e o gelado que se foi comprar, de mão dada, com o avô. Ir ao médico, levar vacinas e tomar xaropes quando está doente, perante os olhos ansiosos de quem tem um coração apertadinho. A correria com os primos pelos corredores da casa dos avós e tios, idas à praia, brincadeiras nos parques. Pais preocupados com o futuro, a escola e os amigos, pais que passam noites em claro, por doença ou por receio. Ter quem lhes vista um casaco quando elas não querem (apesar de chover lá fora), quem as carregue no colo quando estão cansadas, quem lhes diga sem medo EU AMO-TE MUITO! Quem lhes chame nomes patetas como Fofinho/a, Bebé, Amorzinho ou Príncipe/Princesa. Quem as eduque e explique que se diz por favor e obrigado, que não se dizem mentiras e que os outros — pequeninos e crescidos — têm sentimentos. As crianças têm direito a tudo isto porque isto é ter uma família. Não bastam as pessoas existirem em seu redor, é preciso que elas ofereçam amor, dedicação, comprometimento, limites e segurança. É possível educar sem gritar? O psicólogo espanhol Guillermo Ballenato garante que sim, e explica como. Hoje em dia, os filhos estão a reclamar autoridade, garante Guillermo Ballenato que esteve em Portugal a lançar o seu livro "Educar sem Gritar". É preciso impor regras e limites às crianças, mas também ouvi-las e dar-lhes atenção. Conjugar firmeza e flexibilidade é a chave do sucesso na educação, mantendo a coerência e o respeito. E não basta boa intenção para ser bom pai. Para este psicólogo, as escolas de pais deviam ser obrigatórias. Afinal, se nos exigem carta de condução para guiar, porque não nos exigem um diploma para educar outro ser?A primeira reacção de muitos pais quando olham para o título do seu livro é dizer que tal é impossível. Tem filhos? Nunca gritou com eles? Sim, tenho duas filhas de 15 e 17 anos, e apliquei desde o princípio as técnicas e propostas que aparecem no livro. O meu testemunho é duplo neste caso, como pediatra e pai. É claro que já gritei algumas vezes com elas. Quando faço essa pergunta numa conferência, ou numa sala cheia de pais, todos levantam o braço dizendo que sim, e pressente-se um riso em fundo. Em algum momento, todos os pais perdem a cabeça, mas não é o mesmo perder a cabeça uma vez pontualmente e desculpar-se, e sistematicamente educar aos gritos. Há um provérbio que diz: "Se educas o teu cavalo aos gritos, não esperes que te obedeça quando simplesmente lhe falas." Só te obedecerá quando lhe gritares. Não se trata só da forma, mas também do conteúdo. Um trato negativo, humilhante, desvalorizante faz perder a auto-estima dos filhos e a autoridade dos pais, porque se perde o respeito. Os filhos devem ver nos pais um modelo de conduta, de respeito e de comunicação, e tenderão a imitar o que vêem em nós. Não podemos dizer aos berros a um filho "Já te disse que não grites!", porque com a nossa conduta estamos a dizer que os gritos são legítimos. Em matéria de autoridade, passou-se de um extremo ao outro. Os pais eram autoritários e hoje são negociadores, os filhos discutem com eles de igual para igual. Estamos a ficar demasiado permissivos? Sim, penso que agora se peca pela permissividade. Os filhos estão a reclamar autoridade, precisam de ser postos no seu lugar. Se tudo lhes é permitido, se nada lhes custa a conquistar, estamos a criar crianças inadaptadas. As crianças têm que ter regras, percebê-las e cumpri-las. Há vários estilos educativos, e acredito que nem o autoritário nem o permissivo ou liberal, nem tão pouco o paternalista ou sobreprotector, funcionam. Penso que o estilo democrático e dialogante é o que resulta melhor. Note-se que não existe uma relação de igualdade, os filhos não estão ao nível dos pais, mas há uma comunicação fluida entre as duas partes. Estão a regressar algumas vozes conservadoras na forma de educar as crianças. A questão é que existe uma confusão enorme acerca do que é a autoridade dos pais. A autoridade que reivindico é moral, fruto da competência, coerência e do sentido de justiça. Um pai injusto ou incoerente é um pai que perdeu a autoridade. A autoridade não vem por se castigar mais. Os castigos são aceitáveis? Sim, mas devem ser o último recurso. Devem ser aplicados pontualmente, com pré-aviso, e têm de ser razoáveis. Por outro lado, deve ser anunciado calmamente à criança - e não a quente -, e deve ser imediato após a conduta errada da criança. E o pior castigo é a ausência de atenção. Ser justo é tão difícil que a prudência aconselha a ser-se benévolo e suave nos castigos. Qual é então o grau certo de autoridade e como exercê-la correctamente? Um pai que tem competência para educar, que é autoconfiante, que é um pai feliz, um exemplo e modelo de carisma que apeteça seguir, conquista uma autoridade moral enorme. Nos primeiros anos de vida, as crianças devem ter normas muito claras e fixas. Se, um dia, um pai recusa uma coisa para no dia seguinte a permitir, rapidamente terá um problema, as crianças detectam todas as incoerências. É essencial ser-se sistemático, e isso é válido ontem, hoje e amanhã. Deve dizer-se que as crianças não podem dormir na cama dos pais, e não abrir excepções. Quem permite excepções uma, duas, três vezes, perde a mão e vive numa discussão constante. A arbitrariedade é o pior inimigo da educação. Mas ao descrever um bom pai parece estar a falar de um líder político ou de um gerente de empresa. Não se exige hoje demasiado dos pais? Sim, sei que é muito difícil. Mas essa é uma boa comparação: o que faz hoje um líder numa organização? Cuida e confia nos seus funcionários. O que deve fazer um pai? Também cuidar e confiar nas capacidades dos seus filhos. Deve estar com eles, dedicar-lhes tempo, o mesmo que deve fazer um bom chefe. É evidente que não há máquinas perfeitas de educar, mas modelos e regras a seguir. Quando os casais decidem ter filhos estão conscientes da enorme dificuldade que é educar uma criança? Têm formação suficiente para serem bons pais? Não. Não conhecem princípios psicológicos muito básicos, por exemplo não sabem como se explica a conduta humana. Penso que as escolas de pais são fundamentais para dar essas bases. O que quis fazer neste livro é um manual sensato e simples com regras básicas a seguir. Cita no livro uma frase que diz que os pais chegam a estar tão convencidos que os educadores e os psicólogos sabem o que é melhor para as crianças, que se esquecem de que eles são os verdadeiros especialistas nos seus filhos. Acabam por educar por livros e revistas e não com o seu bom senso ou razão. Isto não cria pais ansiosos e inseguros? Sim, por isso repito que a escola de pais - nos centros, nas escolas - devia ser obrigatória. Temos de ter formação para guiar um carro, porque não devemos ter também para educar e formar outro ser? Devíamos ter um diploma para educar, e não o temos. Estas técnicas podem ser ensinadas e há fórmulas e alternativas para resolver alguns dos problemas com que os pais mais se debatem. Só com boas intenções não se pode educar. Como ajustar o grau certo de firmeza e flexibilidade no estilo educativo democrático e dialogante que defende? A verdadeira chave está em ser suficientemente firme e claro nas regras, ponderando-as, e suficientemente flexível quando um momento o exigir. Se um filho adolescente deve regressar a casa à meia-noite, mas um dia há uma festa especial e todos os amigos vão voltar à uma da manhã, se para o filho isso for essencial para que esteja integrado e se sinta parte do grupo, pode permitir-se que chegue mais tarde. Os pais hoje em dia fazem os trabalhos de casa com os filhos, estudam com eles, vigiam os seus deveres. Isto é bom ou mau? Os pais devem relaxar e dar espaço aos filhos para aprenderem sozinhos - na escola, com os colegas e professores -, dando-lhes essa responsabilidade. Esse é o seu trabalho. Adoro a frase "Se queres ver uma criança com os pés na terra, coloca-lhe sobre os ombros uma responsabilidade". E não se devem julgar os filhos pelos seus resultados escolares, mas sim pelo seu esforço. Jamais olhei para a agenda das minhas filhas para ver que deveres têm para o dia seguinte. Nem nunca o farei. Elas sabem que estudar é o seu trabalho, que isso é a sua vida, e que têm essa responsabilidade. Explico-lhes como fazer, dou-lhes métodos e incentivo, mas não me substituo a elas na assunção de responsabilidade. Quais são os maiores erros que os pais cometem na educação dos filhos? Não dar importância aos primeiros anos de vida - dedicar-se aos três primeiros anos é um enorme investimento para o futuro. E também serem demasiado permissivos e brandos, não lhes impondo limites nem regras. Está a aumentar a ansiedade e depressão entre as crianças? Sim, sem dúvida que está a crescer. E aumenta sobretudo de maneira alarmante a intensidade deste tipo de crises. Encontro crianças que parecem adultos em miniatura. E são sobretudo meninos que têm uma jornada pesadíssima, que têm inglês, natação, ginástica, informática, andam numa correria o dia todo e não têm tempo para serem crianças e brincar. Uma educação muito competitiva causa stress e ansiedade. O pais devem preocupar-se, sim, com a felicidade dos seus filhos hoje, e não excessivamente com o que serão quando forem grandes. Todos querem filhos bem sucedidos profissionalmente, mas isso só acontece se forem crianças felizes e não sobrecarregadas. Qual a importância dos reforços e recompensas na educação e como administrá-los correctamente? A recompensa é muito importante, deve ser esporádica e pública. O melhor prémio é o reconhecimento e o elogio. Mas a recompensa não deve ser excessiva. Por exemplo, eu jamais dei um presente às minhas filhas pelos seus êxitos na escola, isso é o seu trabalho e o seu dever. O contrário descamba facilmente numa situação em que as crianças dizem: "Se não há prémio, não o faço." Fala em aproveitar o poder das nossas expectativas sobre os nossos filhos. Dar-lhes autoconfiança elogiando e elevando-lhes as metas. Há duas ideias-chave na educação. Uma é a atenção - esta é a grande maravilha à disposição de todos os pais, é fácil e grátis. É o maior prémio, e o pior castigo é a retirada de atenção. A outra é convicção. A sua expectativa e crença nos filhos origina uma realidade. Se um pai diz a um filho "sei que o vais fazer bem", as hipóteses de isso acontecer são maiores do que se disser "não sei se consegues". Estimular a autoconfiança nas crianças é uma ferramenta poderosíssima. É quase como uma profecia autocumprida. Se se pegar num recém-nascido e se quiser fazer dele um delinquente, é fácil. Os bebés são uma página em branco. Podemos fazer deles quase tudo o que quisermos. Mas que lugar cabe ao material genético de cada criança, o seu próprio feitio? A personalidade não é só resultado da educação... há filhos educados da mesma maneira que são totalmente diferentes. Sim, a ideia de página em branco é metafórica. Mas, se tivesse de apontar um número, diria que 80% vem da educação e 20% da genética. Numa família com três filhos, por exemplo, é surpreendente o impacto da ordem de nascimento nas suas personalidades. Estatisticamente, é significativo que o filho mais velho tende a ser mais responsável, com alta resistência à frustração, com repetição do papel materno e paterno; o filho do meio tende a ser o rebelde, o criativo; o filho mais novo divertido, gracioso, conciliador, mas mimado e com baixa resistência à frustração. Uma educação eficaz não é igual para todos os filhos. Deve ser adaptada ao feitio de cada criança. Guillermo Ballenato é psicólogo, docente e escritor, especialista em Psicologia Educativa, Psicologia Clínica, Industrial e de Formação. O seu último livro, "Educar sem Gritar", um best seller em Espanha, acabou de ser lançado em Portugal pela A Oficina dos Livros. Escreveu-o na qualidade de psicólogo e pai de duas adolescentes. Guillermo trabalha na Universidade Carlos III de Madrid, no Programa de Aperfeiçoamento Pessoal e Assessorias Técnicas de Estudo do Gabinete Psicopedagógico. Na psicoterapia, é especializado nas áreas da depressão, ansiedade, obsessões, dificuldades de aprendizagem, comunicação e relação. Mafalda Anjos - Família EXPRESSO «http://expresso.sapo.pt/life_style/familia/faltam-regras-na-educacao-das-criancas=f508483» A antropóloga Kristen Hawkes tem vindo a estudar o papel das avós na sociedade humana e nas espécies que nos são mais próximas. E conclui que é por causa da existência destas cuidadoras extremadas que temos evoluído para a monogamia, uma tese que colhe discórdia entre os antropólogos O que fazem as avós? Alimentam-nos, dão-nos mimos e estão constantemente a dar-nos a volta com perguntas sobre o nosso estado amoroso. Mas às avós pode também estar reservado outro papel, pelo menos de acordo com a antropóloga Kristen Hawkes, que diz serem elas a força motriz por detrás da evolução de grande parte da sociedade humana. Hawkes, especialista em evolução humana e biologia social na Universidade do Utah, é autora de vários estudos sobre a “hipótese avó”, na qual defende que muitas das características que nos distinguem dos nossos antepassados macacos se devem ao papel de cuidadoras extremadas que são as mães das nossas mães. No último estudo, que foi publicado há uma semana na Proceedings of the National Academy of Sciences (também conhecido como PNAS, a revista científica da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos), Hawkes e os outros co-autores explicam como a “instituição avó” é um factor crucial na disseminação da monogamia. A explicação tradicional da evolução humana diz que, quando as avós começaram a ajudar a criar os netos, as filhas ficaram libertas para procriar mais e em períodos mais curtos de tempo. Essas avós de longa duração acabaram por ter mais netos e estes, por sua vez, acabaram por herdar os genes dessa longevidade e assim ajudaram ao aumento da esperança de vida. O homem, por sua vez, aproveitou as vantagens de ter uma vida mais longa e de passar a usufruir de redes sociais mais alargadas e optou pelo acasalamento com uma única mulher, e daí as relações humanas se terem tornado monogâmicas. Não admira que sejam sempre as avós a lembrar-nos de que ainda não casámos! A sequência de eventos que liga a existência das avós à relação monogâmica pode ser rebuscada mas é sem dúvida atractiva. Começa, como defende Hawkes, com um povo do Norte da Tanzânia, os Hadza. A antropóloga começou a estudar os Hadza no anos 1980. São dos últimos caçadores-recolectores do mundo e desde há dezenas de milhares de anos que mantêm o mesmo estilo de vida. Não se dedicam à agricultura mas à caça, à imagem do que já faziam os seus antepassados, e são por isso uma raríssima janela aberta sobre o passado pré-histórico do homem, como justifica a antropóloga. Uma das muitas coisas que tanto Hawkes como os seus colegas acabaram por concluir é que as anciãs do povo Hadza eram “fantásticas recolectoras de tubérculos”, diz a antropóloga. “Era nas mãos delas que estava a tarefa de encontrar este precioso recurso alimentício. Para os mais pequenos, precisamente por serem ainda pequenos, seria difícil descobrir os tubérculos, mas elas faziam-no e davam-nos a comer às crianças.” Para nós, que temos avós que insistem em encher-nos o estômago sempre que as visitamos, esta ideia pode parecer até mundana. Mas foi uma espécie de momento “eureka” para Hawkes. Como qualquer documentário sobre natureza pode atestar, as prioridades no mundo animal são: 1.) procurar alimento; 2.) procurar companheiro. Dito isto, percebe-se que, no mundo animal, a presença de uma fêmea na comunidade já depois de ter passado o seu tempo fértil é uma anomalia. Entre os primatas, os humanos são a única espécie que continua a viver para além da menopausa. A possibilidade de procriar é o que comanda a evolução de uma espécie e não há qualquer razão evolucionista válida que justifique a permanência de elementos femininos que há muito passaram o seu apogeu como reprodutoras. A não ser, como sugere Hawkes, que passem ao papel de avós. Em 1997, Hawkes e os seus colegas antropólogos James O’Connell e Nicholas Blurton Jones publicaram um estudo no jornal Current Anthropology no qual defendiam que a esperança de vida na mulher tem aumentado e evoluído na medida em que foram desenvolvendo um papel mais significativo enquanto cuidadoras dos mais novos. Com uma mãe-avó por perto, a filha podia ter mais crianças e com gravidezes mais próximas, pois, ao invés de esperar que o mais novo cresça e seja independente até ter o próximo, contava já com essa preciosa ajuda (entre os primatas, os humanos são também os únicos que dão à luz uma segunda cria antes de a primeira estar completamente desenvolvida). Quanto mais uma mulher viva além do seu apogeu reprodutor, mais netos terá a possibilidade de vir a criar. Quer isto dizer que as avós de longa duração acabaram por ter descendências mais alargadas e também a possibilidade de disseminar os seus genes da longevidade. O resultado ao longo de milénios foi que a esperança de vida da mulher para além da idade fértil multiplicou-se por décadas. Em 2012, Hawkes esteve a trabalhar com uma especialista australiana em estatística para arranjar um modelo matemático para estudar este processo. E chegaram ambas à conclusão de que ao longo de 60 mil anos as avós quase conseguiram duplicar a esperança média de vida por comparação com os nossos primos macacos mais próximos. Com este resultado — humanos que vivem muitos mais anos do que alguma vez aconteceu na história da evolução humana —, Hawkes fez-se esta pergunta: então e o que se passa com os homens? Ao contrário da mulher, a fertilidade masculina não entra em declínio por volta dos 40 anos. Significa isto que as sociedades humanas têm tido muito mais homens férteis do que mulheres com quem estes possam acasalar. E isto foi uma grande mudança desde as sociedades matriarcais dos nossos antepassados e familiares primatas, nas quais normalmente o número de fêmeas em idade fértil ultrapassava o dos machos (numa linguagem das ciências da natureza, os machos tendiam a passar mais tempo a caçar e na luta, correndo por isso muito mais riscos de morrer prematuramente). Há três modos de os machos maximizarem a sua descendência de acordo com aquilo que manda a natureza, e que é o prolongamento da espécie: podem tentar acasalar com o maior numero possível de fêmeas; podem ficar com uma só fêmea e tentar impedir que outros machos se aproximem dela; ou podem ainda investir tempo e recursos na educação das crias que já tenham. Na maioria das espécies, o que se verifica é que os machos optam pela primeira situação já que a “senhora” engravida e depois fica a tomar conta da “ninhada”. É por isso que os bonobos, ou chimpanzés-pigmeus — os nossos parentes mais próximos — , têm taxas astronómicas de interacções sexuais. Se olharmos para o caso masculino, no rácio de adultos em idade fértil, o papel de Don Juan pode tornar-se mais arriscado. Por serem altamente competitivos, “para eles, a vantagem acaba por ser manterem vigilância sobre as mulheres que já têm”, como diz Hawkes. Para estes homens de longa duração, acasalar para a vida, manter e proteger uma só mulher e os seus filhos acabou por se tornar uma vantagem da evolução. E foi assim que nasceu a relação monogâmica, como sustentam Hawkes e os seus colegas no estudo agora publicado no PNAS. A “hipótese avó”, acreditam Hawkes e os seus colegas, pode ainda revelar outras qualidades humanas únicas: aumento do tamanho do cérebro (porque quem vive mais anos pode dedicar mais tempo à aprendizagem e retirar daí as respectivas recompensas); comunidades mais complexas (porque educar uma criança deixou de ser uma tarefa independente para passar a ser um esforço conjunto); maiores indíces de competitividade (promovidas precisamente pelo aumento do tamanho do cérebro e pelas comunidades mais alargadas); e até empatia (porque redes sociais mais extensas requerem de todos nós uma evolução no sentido do respeito e compreensão pelo outro). “Quando começamos a levar a sério esta ‘hipótese avó’ é espantoso o quanto ela nos pode transmitir [sobre a vida em sociedade]”, diz Hawkes. “É uma fonte verdadeiramente rica para tantas outras actividades.”
Nem toda a gente está de acordo sobre a “hipótese avó”, bastante controversa no mundo da antropologia. Muitos estudos têm defendido que, para a evolução humana, o contributo das avós é insuficiente para justificar o crescimento tremendo da longevidade humana. Outros estudos lembram que a hipótese de Hawkes descura o papel dos elementos masculinos das comunidades caçadoras-recolectoras, incluindo os próprios Hadza, de que são os homens o garante da maior parte da alimentação dos mais novos do grupo. Há uma teoria sobre a menopausa que compete com a de Hawkes mas defende que a mesma se deve ao conflito entre as mulheres de diferentes gerações. Noutras espécies, como por exemplo nos elefantes, as fêmeas mais jovens suprimem a sua fertilidade enquanto houver fêmeas mais velhas a procriar, de modo a não entrarem em competição directa na busca de segurança ou de alimentos. Hawkes refuta estas teses argumentando que a “hipótese avó” é desconfortável para muitos cientistas simplesmente porque vira do avesso as crenças arreigadas sobre as sociedades humanas. “A cartilha que nos é contada” sobre monogamia, como diz esta antropóloga, é que ela começa no seio de famílias nucleares e relações duradouras e estáveis. Se essas relações estivessem para durar, então as mulheres mais depressa estariam disponíveis para acasalar com os melhores machos caçadores de forma a que comunidades mais alargadas e inteligentes se pudessem formar. “Já conhecemos de gingeira a história do Ozzie & Harriet e do Leave it to Beaver [séries americanas sobre a vida familiar dos anos 1950]”, diz Hawkes, não sendo por isso de estranhar que os antropólogos tomem os seus exemplos por garantidos. O que a “hipótese avó” sugere é que a monogamia pode não ser uma qualidade inata porque na narrativa desta antropóloga ela é estudada ao longo dos tempos e apresentada como resposta às circunstâncias de cada momento, tal qual outra adaptação do humano à evolução. Talvez as conclusões a que chega possam não ser particularmente românticas, mas ainda assim pode vir a ser uma hipótese a ter em conta. Tentem perguntar à vossa avó na próxima vez que elas vos ligar. Sarah Kaplan Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post "Toda a doutrina social que visa destruir a família é má, e para mais inaplicável. Quando se decompõe uma sociedade, o que se acha como resíduo final não é o indivíduo mas sim a família." Victor Hugo |