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A relação entre pais e filhos tem “extrema relevância” no desenvolvimento emocional dos jovens e um “efeito significativo” na forma como gerem os seus namoros, concluiu um estudo da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). A coordenadora da investigação, a psicóloga clínica Catarina Pinheiro Mota, explicou hoje à Lusa que os filhos vão replicar, na sua vida afetiva a relação que têm com os pais.
A título de exemplo, a investigadora afirmou que se houver uma relação “estável” entre pais e filhos, estes terão “maior disponibilidade” para ter e manter namoros, mas se a relação for “instável” os jovens terão “mais dificuldades”. Outra das conclusões é a de que os filhos “replicam” nas relações amorosas os conflitos dos pais, avançou. “Os filhos que presenciam conflitos interparentais vão, no futuro, ter uma relação amorosa pautada por este modelo”, frisou. E concretizou: “todos os pais discutem, mas se resolvem a discussão aos gritos, por exemplo, os filhos vão ter esse modelo e replica-lo no namoro”. O estudo realçou que os jovens resolvem os conflitos no namoro através de duas formas: estratégias de resolução não abusivas e estratégias de resolução abusivas e comportamentos violentos. Os comportamentos não abusivos são realizados por jovens mais velhos, especialmente raparigas, entre os 22 e 25 anos. Os jovens que recorrem a estas atitudes para resolver conflitos têm “baixos níveis de sintomatologia depressiva, ansiedade e sensibilidade interpessoal” e maior confiança no namoro. Por seu lado, os comportamentos violentos são adotados maioritariamente por rapazes, sem diferenciação de idades, e associam-se a jovens com sinais depressivos. “São preditos pela maior intensidade e frequência dos conflitos interparentais”, referiu a investigadora. O estudo teve uma amostra de 505 jovens da zona norte do país, entre os quais 139 rapazes e 366 raparigas com idades entre os 18 e 25 anos e habilitações entre o 9.º ano e ensino superior. Os investigadores de Psicologia Clínica da UTAD, em Vila Real, quiseram entender a “qualidade de vinculação aos pais e o seu efeito na vinculação amorosa em jovens adultos”, tal como o “papel dos conflitos interparentais no desenvolvimento dos conflitos no namoro". LUSA - EDUCARE «http://www.educare.pt/noticias/noticia/ver/?id=80585&langid=1»
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Esta é a carta do Pedro, um menino que mora numa das muitas zonas carenciadas de Portugal e cuja carta que ele enviou para o Pai Natal me veio parar às mãos através de um amigo que tenho nos CTT. Olá Pai Natal. Espero que esteja tudo bem contigo aí pela Lapónia. Aqui também está frio. Eu sei que com tantas prendas deves confundir às vezes o endereço, só assim se justifica o facto de tantos meninos maus receberem tantas e tão boas prendas. É suposto os meninos maus não receberem prendas, ou ouvi mal e afinal é os meninos pobres? Os ricos, mesmo que sejam mal comportados e respondam mal à professora e aos pais recebem prendas? Às vezes parece que é isso que acontece, mas espero estar enganado. Sei que este ano não fui um menino bem comportado, mas envio-te esta carta na mesma para pedir algumas prendas. Houve algumas vezes que respondi mal à professora, outras que não arrumei o meu quarto e por isso não vou pedir prendas para mim, mas gostava de te pedir para os meus pais. O meu pai trabalha muito, quase nem o vejo, nem ao fim-de-semana. Ele sai de casa muito cedo, ainda o sol não nasceu, mas vem sempre dar-me um beijo na testa que é quando eu acordo para me começar a preparar para ir para a escola. Depois só o volto a ver quando chega a casa e entra no meu quarto para me dar outro beijo, já eu estou prestes a dormir, porque ele chega muito tarde. Anda sempre muito cansado e triste, porque não gosta do seu trabalho e ainda por cima ganha 500€ só. Ao menos tem trabalho, é o que ele diz. A minha mãe não tem. Teve durante muitos anos mas foi despedida por causa da crise há 3 anos. Tentou encontrar trabalho durante muito tempo mas toda a gente lhe dizia que não queriam contratar uma mulher de 43 anos, que estava velha. Agora está em casa, arruma a casa toda sempre. Até a minha cama que eu não tenho tempo de fazer porque saio sempre com pressa para ir para as aulas. Comida ainda vai havendo Pai Natal, nunca passei fome, há sempre pão e manteiga e às vezes cereais para o jantar. Ás vezes a minha mãe só come duas bolachas ao jantar, ela diz que é porque não tem fome, mas eu acho que é para haver mais para mim. Às vezes também estou no quarto, que é na sala e oiço os meus pais discutirem. O motivo é sempre o mesmo, falta de dinheiro para pagar as contas. O que o meu pai ganha não chega para mantermos a casa, que é alugada, e ouvi dizer que há muitas contas para pagar atrasadas. A minha mãe fica muitas vezes a chorar e o meu pai a tentar animá-la, mesmo depois de terem discutido. Ele diz que alguma forma se há-de arranjar para pagar as contas. Por isso, tudo o que eu te peço Pai Natal é que dês um emprego à minha mãe e que o meu pai tenha um aumento e que não tenha que passar tantas horas longe de nós. Era tudo o que eu queria. Esquece a carta que te enviei do último ano, caso ainda a tenhas guardado para este. Esquece a Playstation 4 que te pedi, os bonecos e tudo o resto. Se já compraste dá antes a outro menino que precise mais. Eu só preciso que os meus pais estejam felizes. Que o dinheiro não seja a razão pela qual eles se separem, nem a razão pela qual eles não passam tempo comigo. Eu quando crescer vou ser Doutor e dar aos meus pais tudo o que eles me dariam se tivessem dinheiro. Queria também pedir-te outra prenda, se não for pedir muito. Queria que desses um bilhete de avião ao meu irmão mais velho, Jorge, que está em França a trabalhar. Já não o vejo há 3 anos e tenho muitas saudades dele. Ele teve que ir para fora porque cá não arranjava emprego, apesar de ter tirado um curso e tudo. Foi trabalhar para lá e vai enviando algum dinheiro para ajudar, infelizmente ele também não ganha muito e tem lá a vida dele. Eu gostava muito de o ir visitar, mas sei que os meus pais não podem, e como sei que é mais barato e que o meu pai não pode tirar férias, pedia-te que lhe oferecesses um bilhete de avião para ele vir cá. Se lhe pudesses oferecer um emprego em Portugal então ainda era melhor. Ele não gosta de estar lá, diz que tem saudades da nossa comida e do nosso sol. Eu sei que tu deves ter muito trabalho Pai Natal, que deve exigir muito de ti ofereceres prendas a todos os meninos e que, por vezes, haja alguns erros. Mas não consigo perceber como é que há tantas pessoas sem nada e outras tantas com tanto. Eu nem me sinto bem em queixar-me, pois sei bem que há meninos que estão bem pior que eu e que nada fizeram de mal para tal. Sei que há crianças a morrer de África de fome... De fome Pai Natal! Leva-lhes comida. Há crianças que não têm casa, não têm sequer dinheiro para um caderno e uma caneta para irem à escola. Ajuda-os Pai Natal. Há meninos com doenças graves que não têm dinheiro para os tratamentos. Tenho um colega meu que tinha Leucemia e que os pais tiveram que andar a pedir a toda a gente para o poderem curar. Já morreu entretanto. Ajuda esses meninos, esses pais que sofrem tanto. Os meus colegas todos da escola já não acreditam em ti, dizem que não existes e quem nos dá as prendas são os nossos pais e familiares. Eu não acredito neles, acredito nos meus pais que dizem que tu existes. Só podes ter sido tu a oferecer-me aqueles brinquedos no Natal passado, porque os meus pais não tinham dinheiro para isso. Não tinham dinheiro para me oferecer um brinquedo de 20€ quando a minha mãe se está sempre a lamentar por não ter dinheiro para um casaco mais quente no Inverno. Por isso, tens que ser real. Se não fores real, é sinal que foram os meus pais a fazer o sacrifício para me dar uma alegria no Natal passado e eu gostava de saber isso para lhes agradecer ainda mais o que fazem por mim. Hoje vou ficar acordado a noite toda para te ver chegar. Quando entrares pela chaminé, vou-te dar um abraço grande, mesmo sabendo que não me trazes prenda nenhuma, sei que vens trazer o que te pedi para a minha família. Adeus Pai Natal, faz boa viagem Assinado: Pedro Por sua vez, o Bernardo, filho de uma família abastada da linha de Cascais, também enviou um email ao Pai Natal através do seu novo iPad: Pai Natal, Espero que este ano não te esqueças do que eu pedi. No ano passado só me trouxeste a Playstation 4 com 3 jogos, quando eu tinha pedido pedi 10!!! Os bilhetes que eu tinha pedido eram para a Disney World nos Estados Unidos, não eram para a Disney Land em Paris!!! Não é justo! Espero que este ano tenhas uma bocado mais de atenção se não eu vou fazer queixa ao meu pai. Velho caquético de merda. Assinado: Bernardo Maria de Mello e Corte-Real Espírito Santo Algo me diz que o Pai Natal vai trazer os presentes todos para o Bernardo e se vai esquecer mais uma vez do Pedro Um feliz Natal a todos e obrigado pela prendas em formas de visualizações, likes, comentários e partilhas que me deram este ano todo. Sois uns fofos. Doutor G «http://porfalarnoutracoisa.sapo.pt/2014/12/carta-ao-pai-natal-de-um-menino-mal.html» Hoje assinala-se o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência! Portanto, parabéns para mim? Gosto de palavras. Gosto da liberdade de as poder usar e gosto de conhecer cada vez mais o poder que elas têm sobre as nossas ações. A língua portuguesa é demasiado rica para o uso que lamentavelmente lhe damos. Já eu gosto de a descobrir, à medida que cresce a minha vontade de comunicar com o mundo e incluir-me nele.Os meus pais deram-me um nome quando nasci. É esse nome que as pessoas usam para me chamar, em todos os dias do ano. Mas eu não sou só portadora de um nome. Sou também portadora de deficiência e de uma cadeira de rodas, desde que existo. Essas são características que eu tenho - também diariamente - mas que não me definem enquanto pessoa. Fazem parte de mim mas não são eu. Por isso, o único dia em que assumo como a da celebração de quem eu sou é o dia do meu nascimento. No entanto, a sociedade atual criou (e continua a criar) efemérides nas quais eu podia perfeitamente “enfiar a carapuça”. Hoje assinala-se o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência! Portanto, parabéns para mim? Desculpem, mas eu nunca fui uma defensora acérrima do dia 3 de dezembro, o que também não me torna necessariamente alguém do contra. Só que não passo um ano inteiro à espera deste dia. Bem vistas as coisas, eu sou uma pessoa “com” deficiência desde 1983 e a ONU apenas criou esta efeméride a 14 de Outubro de 1992. Com o objetivo de, assinalando este dia internacionalmente, todos os países passarem a comemorar a data, gerando consciencialização, compromisso e ações que transformem a situação dos deficientes no mundo. Ando cá há 32 anos a ouvir falar de consciência e de comprometimento, agora ações facilitadoras, refletidas no dia-a-dia das pessoas como eu, como forma de inclusão, essas caem constantemente no esquecimento dos que criam as leis ou são responsáveis pelo seu cumprimento. Ser alguém com deficiência não é uma opção, existe 365 dias por ano. Segundo, não é uma escolha “dos outros”. Isto é, se não é algo que não nasceu connosco, já não nos apanha! Ter consciência do que é esta efeméride, do que significa a condição de “pessoa com deficiência”, é ter cada vez mais consciência sobre quem somos. “Pessoa” vem antes de “deficiência”, por isso adquiri-la está ao alcance de qualquer um; seja por velhice, acidente, insucesso de uma cirurgia, negligência médica ou até o aparecimento de uma doença. Por incrível que pareça, as pessoas com deficiência não são necessariamente doentes, mas o contrário pode acontecer. Será que é porque a palavra “efeméride” tem a mesma etimologia do que a palavra “efémero/a”, que significa “dura um dia”? O que eu sei é que precisamos de fazer muito mais pelas pessoas do que assinala-las. Aquilo que eu defendo é que a linha que separa os “coitadinhos” dos “super-heróis” - e que normalmente vem agarrada à palavra deficiência - deve existir (e subsistir) na agenda mediática, para lá deste dia. Que se façam conferências sobre a temática, descerrem placas em inaugurações de obras com melhores condições de acessibilidade, ofereçam tempo de antena nos media a quem precisa de se fazer ouvir (e de alguma forma se sente “aprisionado” na sua condição de pessoa com deficiência), mas acima de tudo que consigamos ser, cada um de nós, mais pró-inclusivos no nosso dia-a-dia. Que longe dos holofotes, microfones e rótulos de pessoas conscientes das diferenças “dos outros”, façamos um compromisso diário com a nossa condição de cidadãos e, por exemplo, que coloquemos isso em prática, ao não estacionarmos em lugares reservados. Nem por cinco minutos. Ser portador de deficiência não é um número, que faz parte de uma estatística; é ser alguém com necessidades especificas, que podem ser supridas numa sociedade virada para as pessoas e não para as datas. Precisamos de chamar as pessoas pelo nome, conhecer os seus rostos e as suas histórias, tanto de frustração como de superação diária, para lá de um dia instituído no calendário. Precisamos de aprender a conhecer o poder da palavra INCLUSÃO, gostar dela, e fazer bom uso dela, naquilo que a todos e a cada um diz respeito. Mafalda Ribeiro - VISÃO «http://visao.sapo.pt/opiniao/bolsa-de-especialistas/2015-12-03-Efemeride--Para-que-te-quero- Neste tempo de terrorismo global, quando o boomerang da História se volta contra uma Europa que traiu ou ignorou ressentimentos e injustiças de vários povos, importa não fugir ao combate: nas escolas e nas universidades é tempo de ler a Filosofia, cultivar o saber sincrético, não desconhecer quanto a Europa ficou a dever à cultura árabe, da matemática à poesia, da geografia à astronomia. No seu artigo de 18 de Novembro, Santana Castilho faz o elenco de alguns dos mais terríveis crimes perpetrados por jovens ocidentais. Esses crimes foram, quase todos, realizados em recintos escolares. No fundo, a tese de Santana Castilho, com a qual concordo, põe a tónica na concepção meramente instrumental do sistema educativo no Ocidente, considerando o autor desse artigo que há um ódio e uma frustração, um desencanto geral das juventudes europeia e americana: ódio, frustração e desencanto que justificam tais actos de violência. De Eric Harris e Dylan Klebold (os dois jovens que mataram no Instituto Colombine, em 1999), ao extremista de direita Breivik (o dos crimes da ilha de Utoya, em Julho de 2011), esses crimes demonstram quanto uma educação obsessivamente técnica pode fazer germinar no seio das sociedades ditas desenvolvidas licenciados e doutorados incapazes de compreender o outro na sua diferença cultural e humana. No limite, o diagnóstico apresentado por Heidegger em Língua Técnica e Língua de Tradição estará correcto: uma sociedade que esquece ou menospreza a língua de tradição (para Heidegger é essa a língua da poesia e das artes), encaminha-se para a sua auto-destruição. Não é, pois, absurdo relacionar o que aconteceu em Paris no dia 13 de Novembro com a crise da educação que tantos e tantos estudiosos têm vindo a denunciar, em maior ou menor grau, desde os anos oitenta.Ficou célebre, em dada altura, a tese de Allan Bloom, autor do livro A Cultura Inculta, à luz da qual se postulava que, dos bancos das escolas aos bancos das universidades, as gerações nascidas e educadas nas décadas de 1970/1980 em diante não tinham a preparação humanística que lhes permitiria compreender o mundo na sua complexa dialéctica social, política e cultural. Para Bloom o dignóstico estava feito: a decadência geral do Ocidente dever-se-ia a um problema de linguagem. George Steiner, que tem vindo em diversos livros, a alertar para o facto de os mais jovens europeus e americanos desconhecerem profundamente as raízes da civilização a que pertencem, condena, em Barbárie da Ignorância (2000), o modelo de educação e desenvolvimento do Ocidente e refere mesmo que o único programa em curso na educação ocidental é a “amnésia cultural”.
Na verdade, da música (é ouvir e ler as letras de bandas de algumas bandas de hip-hop ou alguns êxitos recentes de videoclips que rasam a pornografia) à literatura (onde as bestas célebres inundam o mercado livreiro com a boçalidade da moda), do cinema (ao serviço da infantilização estupidificante das massas, como comprova esse pérola do hodierno, As 50 Sombras de Grey...), à indústria do desporto (o jogador de futebol como modelo de beleza e de virtudes, de Ronaldo a Beckham), o lazer que se promove é o que passa pela excitação gratuita dos sentidos, ampliada pelo virtual, por uma internet onde abundam conteúdos perniciosos para o salutar crescimento de crianças e jovens. Excitação que, a meu ver, encerra como linguagem única a violência, isto é, uma propensão para o conflito geracional, em virtude de uma alucinação geral: a indistinção entre ficção e realidade. Não espanta, pois, que, para os mais novos o antigo, o clássico lhes pareça velho e represente um mundo que recusam porque não compreendem. Essa violência latente ou declarada é visível quer nas praxes académicas (são precisos exemplos?), quer na insuficiência dos raciocínios que, não raro, em entrevistas de rua ou nos reality shows muita juventude denota. Não se trata, claro está, de diabolizar os que hoje têm entre 15 a 30 anos, até porque são as principais vítimas de uma ideologia do entretenimento e da alienação que nos trouxe até aqui. Em rigor, poderão as gerações mais velhas orgulhar-se da sociedade televisiva, superficial, mediática e computacional que ergueram? Já se sabe que o avanço tecnológico e a economia global são imparáveis, mas a indústria mediática, nas mais diversas áreas em que actua, em vez de sacrificar tudo ao futebol e ao sexo, aos concursos alienantes e à ditadura da publicidade, não deveria parar e repensar a sua função? Que cultura se tem vindo a edificar nos últimos 30 a 40 anos em Portugal e na Europa, senão a cultura inculta? Que democracia podem os povos viver quando à crise financeira e à austeridade sobrevém a ideologia do terror, a porta por onde poderão entrar de novo na Europa regimes fascistas, ao abrigo da vertigem securitária? Tendo em conta quanto temos vivido desde o 11/9, para me servir de uma data que simbolicamente nos fez entrar no século XXI, não será este o momento de – da escola e das universidades, aos mídia e às empresas – relacionarmos a tão propalada “crise de valores” com a “crise das humanidades”? Longe de pensar que a poesia ou as artes podem salvar o homem, julgo, ainda assim, que é um erro declarar que uma educação centrada nas humanidades é sinónimo de serôdio romantismo. Mas nada de ilusões: a Europa foi berço, é verdade, das guerras mundiais, e de conflitos étnicos que são lições que os europeus não podem ignorar. Neste tempo de terrorismo global, quando o boomerang da História se volta contra uma Europa que traiu ou ignorou ressentimentos e injustiças de vários povos, importa não fugir ao combate: nas escolas e nas universidades é tempo de ler a Filosofia, cultivar o saber sincrético, não desconhecer quanto a Europa ficou a dever à cultura árabe, da matemática à poesia, da geografia à astronomia. António Carlos Cortez Opinião - PÚBLICO 'http://www.publico.pt/opiniao/noticia/o-fim-da-europa-terrorismo-e-educacao-ou-o-combate-urgente-1716198» Uma investigação da Universidade de Chicago revela que as crianças que não acreditam em Deus são mais altruístas e mais dispostas a ajudar o próximo do as que são criadas num ambiente religioso. Um estudo americano realizado com crianças - com idades compreendidas entre os 5 e os 12 anos - revela que os indivíduos criados em ambientes religiosos têm menos atos de generosidade para com o próximo do que aqueles que não têm qualquer ligação com a religião. Uma conclusão surpreendente uma vez que a generosidade e bondade são valores que fazem parte da educação religiosa que lhes foi incutida pelos pais.
“É importante destacar que as crianças mais altruístas vêm de famílias ateias e que não são religiosas”, refere o psicólogo, neurocientífico e autor do estudo Jean Decety ao jornal espanhol El País. “Espero que as pessoas comecem a entender que a religião não é uma garantia para a moralidade e que são conceitos diferentes.” A explicação para esta atitude por parte de indivíduos religiosos reside no facto de uma vez que já cometem atos de generosidade dentro da sua paróquia e comunidade religiosa, isso exime-os de ter que proceder de igual forma com estranhos. “É uma falha mental particularmente interessante: ao fazer o bem […] desinibe-se o comportamento egoísta e ficamos propensos a tomar decisões imorais”, conclui Decety. Outra parte curiosa desta pesquisa prende-se com o facto de as crianças religiosas serem mais intolerantes e condenarem mais severamente os atos de terceiros. O artigo publicado por Jean Decety vem assim refutar a investigação realizada por Azim Shariff que, em 2008, se debruçou sobre o mesmo tema. Relativamente ao novo estudo, Sharriff considera que este divulga “conclusões fascinantes” e que nos “obriga a repensar seriamente nas coisas”. Maria Lima dos Santos SAPO «http://lifestyle.sapo.pt/familia/noticias-familia/artigos/criancas-ateias-sao-mais-generosas-e-altruistas-diz-estudo» Crianças com um diagnóstico de Perturbação do Espetro do Autismo (PEA) nem sempre desenvolvem de forma espontânea ou pouco explícita competências literárias ou acompanham num mesmo ritmo que outras crianças A aprendizagem da leitura e escrita inicia-se numa etapa precoce de qualquer criança, através da compreensão de conceitos de literacia e fonologia. Desde a combinação e sequencialização de acontecimentos de forma lógica em imagens representativas até á automatização do Princípio Alfabético. É através da experiência e interação com o ambiente e agentes envolvidos que cada criança desenvolverá num ritmo próprio, mas dentro de um período normativo, as competências necessárias para ler e escrever.
Para que a leitura e a escrita ocorram, é necessário que a criança consolide a noções de correspondência som-grafema-som, sistema alfabético e fonologia em diferentes padrões que lhe permitirão autonomia e fluência em ambos os processos. Crianças com um diagnóstico de Perturbação do Espetro do Autismo (PEA) nem sempre desenvolvem de forma espontânea ou pouco explícita competências literárias ou acompanham num mesmo ritmo que outras crianças. Embora seja frequente observar noções precoces de grafemas (algumas desenvolvem um interesse marcado por letras e conhecem o alfabeto desde muito cedo), apresentam lacunas significativas noutras competências, como a compreensão do que é lido, interpretação literal do conteúdo, compreensão da utilidade e regras para a leitura e escrita eficaz, correspondente a cerca de 80% de crianças com PEA. O universo de perfis das PEA não permite correlacionar e definir a intervenção na leitura e escrita antecipadamente. Algumas crianças ao longo do seu desenvolvimento apresentam perturbações da comunicação, da linguagem, sensoriais, comportamentos repetitivos e restritivos, interesses, dificuldades na compreensão do abstrato, entre outras, que embora preditores, não contribuem necessariamente para dificuldades na aprendizagem da leitura. Embora instruções verbais e descodificação leitora tendam a ser tipicamente áreas fracas, suportes visuais são recursos essenciais a adicionar como meio aumentativo de programas estruturados para a aprendizagem da leitura. Algumas metodologias de ensino têm sido criadas de modo a oferecer um apoio especializado e dirigido à competência da criança. O mais comum é o método global, e para além deste, foi desenvolvido também o método das 28 palavras. Um aspeto transversal a estes métodos é o contexto ou contextos reais da criança, ou seja, pretende-se que a criança seja capaz de associar e atribuir significado a todos os elementos introduzidos, assim como a associação de uma imagem/símbolo à palavra ensinada. As crianças com PEA podem apresentar muitas vezes dificuldades motoras que comprometem a aprendizagem da escrita. Estas dificuldades podem ser mais gerais, ao nível da motricidade global, ou mais específicas para a grafomotricidade, como a motricidade fina. Quando as dificuldades comprometem o ritmo de aprendizagem e limitam o seu desempenho, tipicamente recorre-se ao uso de letra de imprensa maiúscula, evitando penalizar e potencializar negativamente aspetos relacionados com a motivação e autoestima. Noutras circunstâncias, com crianças com dificuldades significativas na grafomotricidade, o uso do tablet ou computador torna-se a ferramenta chave como meio auxiliar e aumentativo para promoção da sua aprendizagem e autonomia para a escrita. A equipa terapêutica tem o papel, em conjunto com o corpo docente e os pais, enquanto elementos centrais, de avaliar as áreas deficitárias, identificar as áreas fortes, definir objetivos atingíveis de acordo com o potencial da criança e qual o método mais apropriado para estas aquisições tão importantes e intervir de modo a promover a aprendizagem e o sucesso. Ana Beirão – Terapeuta da Fala – ana.beirao@pin.com.pt Raquel Mata – Educação Especial e Reabilitação – raquel.mata@pin.com.pt artigo de PIN – Progresso Infantil «http://lifestyle.sapo.pt/familia/crianca/artigos/autismo-aprender-a-ler-e-a-escrever» Já está disponível o relatório Education at a Glance 2015, da OCDE. Portugal, em alguns indicadores, ainda se encontra longe da média dos trinta e quatro países que compoem a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico. No entanto, em termos globais, tem vindo a recuperar. Se não vejamos alguns dados, a título de exemplo: — O nosso país encontra-se a sete posições da cauda da estatística entre os países onde o número de jovens adultos, entre os 25 e os 34 anos, não concluiu os estudos secundários (entre 30 a 40% desta população). Portugal constitui ainda um dos países em que o número de homens sem o ensino secundário completo é superior ao das mulheres. — Mais de 70% da população com 55-64 anos não concluiu os estudos secundários. — Em compensação, enquanto a maioria da população dos países da OCDE com qualificação a nível superior tem apenas uma licenciatura, em Portugal mais de 75% desta população tem um mestrado ou pós-graduação. A maioria são mulheres. — Do lado oposto, Portugal está entre os os países com menos formandos de cursos vocacionais nos estudos secundários ou pós-secundários não-superiores (cerca de 20%, dos 25 aos 64 anos, enquanto a média ultrapassa os 40%. Na República Checa esta percentagem sobe aos 70%). — As tendências são positivas no que toca aos alunos a estudar no ensino secundário entre 2005 e 2013: em Portugal a percentagem subiu substancialmente, enquanto por exemplo, na Noruega desceram. Também a formação vocacional tem estado em fase de ascensão (mais de 50%), tendo já ultrapassado a média da OCDE (mais de 40%). No entanto, a educação vocacional ainda é desvalorizada em termos de emprego, ao contrário de países como a Dinamarca no qual a taxa de desemprego é menor nos indivíduos vocacionalmente qualificados em comparação com os que têm estudos gerais. — A maioria das graduações em território nacional são nos campos das Ciências Sociais, Económicos e da Advocacia. — Em termos gerais, o desemprego é maior entre indivíduos com menos estudos (secundário) relativamente àqueles que têm formação superior. — Portugal foi ainda um dos países que mais reduziu a despesa pública com instituições educativas neste período, em consequência da recessão económica que o país atravessou.. Estes e outros dados relevantes podem ser observados no relatório que aqui se publica na íntegra (em inglês). Luna tem 12 anos, Maira tem 11. Cresceram com duas mães, mas até agora não as tinham reconhecidas no cartão de cidadão. Esta sexta-feira, Luna esteve na Assembleia da República e aplaudiu a aprovação da lei de adoção por casais homossexuais. Pela sua família, pelas suas mães Luna, um rapaz de 12 anos, chegou preocupado e saiu radiante das galerias da Assembleia da República. Ouviu. Questionou. E aplaudiu a decisão dos deputados. Finalmente chegara o dia que há tanto sonhava. Pedira à mãe Fabíola para o acompanhar, sabia que ia ser um dia decisivo e fez questão de estar presente. Ia assistir à votação da lei, a tal lei que permitiria reconhecer legalmente a sua família. Luna e a sua irmã Maira, de 11 anos, cresceram com duas mães, reconhecem-nas assim, mas apenas Fabíola Neto tinha até agora direitos legais sobre eles, por ser a mãe biológica por via da inseminação artificial. Ana Prata, a outra mãe com quem sempre cresceram e têm a mesma relação de amor e afeto, não era reconhecida pelo Estado como tutora das crianças.No ano passado, Luna saíra desalentado das galerias com a irmã depois de ver chumbada a aprovação da lei por casais do mesmo sexo. E, na altura, dissera ao Expresso que não percebia a razão de tanta confusão e dificuldade para reconhecerem o facto de ter uma família diferente da maioria. E garantira-nos que nunca se sentira gozado pelo facto de ter duas mães e que não achava estranha a sua família. Era a sua, era muito amado, e bastava. "Não sei como seria ter um pai, mas é bom ter duas mães", dizia na altura - na mão tinha “Ulisses”, a adaptação de Maria Alberta Menéres do clássico de Homero, que trouxera para se entreter. "Mãe, este é dos nossos" Tal como no ano passado, este ano assistiu a toda a discussão com muita atenção e em silêncio. Até ao momento que ouviu um deputado do CDS a falar dos "superiores interesses da criança". Luna olha para a mãe e segreda-lhe: "Mãe, este é dos nossos. Ele defende esta lei, não é?" Fabíola sorriu e respondeu-lhe que não. Que na opinião desse senhor deputado o melhor para as crianças não era esta lei... "Mas mãe, não! Não. O meu interesse é que aprovem a lei. Eu quero que aprovem a lei. O que estão a dizer não é verdade. Como é que podem mentir?" Luna estava incrédulo na sua inocência de criança. Como seria possível quererem o melhor para si, mas não quererem aceitar as suas duas mães que tanto amava? Mas a aprovação acalmou-o. E juntou-se logo à irmã e à mãe Ana para celebrarem juntos o resultado durante o almoço em Santarém, onde vivem. Conversaram. Brincaram. Em família. Tudo certo. Este é um momento particularmente importante para os quatro. Ainda mais por terem passado recentemente por episódios particularmente dramáticos, dado que Fabíola foi diagnosticada há um ano e meio com um carcinoma invasivo na mama, facto que a obrigou a uma mastectomia, a dois internamentos e a tratamentos de quimioterapia. Desde aí confrontou-se com a situação frágil, delicada e desprotegida dos seus dois filhos. "O que teria acontecido aos meus filhos se eu eu tivesse morrido na mesa de operações?" Enquanto Fabíola esteve internada, a outra mãe, Ana Prata, não pôde tirar uma licença de apoio à família por não ser reconhecida como tutora. "Teve de contar com a boa vontade do patronato para se ausentar do trabalho. Mas esse direto deveria estar legalizado. Sem favores." Para mais, Fabíola e Ana já não são companheiras, a sua relação amorosa terminou após dez anos juntas, mas continuam amigas e nunca deixaram de educar e zelar pela saúde dos seus dois filhos. "Um compromisso de amor para a vida." Como qualquer outro casal divorciado com filhos. Fabíola sente este dia como um enorme alívio e uma vitória. Para a sua família e para a sociedade. "Este dia foi um dia muito importante. Significativo. Simbólico. Neste momento, Portugal está menos preconceituoso, mais realista, a defender melhor todos os seus cidadãos e todas as suas famílias." Sobre as opiniões que consideram que esta aprovação foi uma decisão errada, precipitada e criada à pressa por esta nova esquerda, responde: "Nós existimos de facto. Somos a prova de que este assunto não é uma invenção repentina da esquerda, mas uma realidade crescente na nossa sociedade e muitas outras. O meu filho faz para a semana 13 anos e sempre foi criado por duas mães. Ele e a irmã são um exemplo de que como esta lei era essencial e urgente para terem os direitos de qualquer outra família. Sempre fomos uma família de amor, de afeto, com responsabilidades económicas e problemas quotidianos como qualquer outra, sem que essa realidade fosse reconhecida até agora pelo Estado português. A partir desta sexta-feira termina uma discriminação que desprotegia e vulnerabilizava a nossa família, particularmente as nossas crianças." Fabíola, professora e ativista há 20 anos pelos direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgéneros, defende que esta mudança vem alargar o conceito de família e de uma sociedade mais rica e diversa. "A lei aproxima-se mais de uma realidade existente na sociedade, sem prejudicar ninguém. Passamos a defender as famílias na sua diversidade. E digo mais: esta aprovação da lei é o fim do último reduto de conservadorismo. Porque é claro que ser homossexual é tão normal e saudável como ser heterossexual e a parentalidade em nada é alterada por isso." TUDO ANALISADO E AVALIADO, COMO DEVE SER
Há muito que Miguel, de 9 anos, perguntava ao pai Jorge Correia, 43 anos, fotojornalista, quando é que passava a ter o nome do pai Pedro. E esta sexta-feira, ao fim do dia, Jorge pôde dizer ao filho "já podemos, já podemos, vamos meter os papéis para o pai Pedro ter direitos legais sobre ti e passares a ter o seu apelido". E um sorriso radiante é partilhado por todos. Parece um detalhe sem importância para uma criança ver o seu nome ganhar mais um apelido. Mas não. "É mais uma prova de segurança que ele sente, a mostrar que estaremos com ele para sempre. Porque ele já se separou uma vez da família biológica." Foi aos 4 anos que Miguel passou a viver com dois pais. Jorge candidatou-se a uma adoção monoparental e até agora era o pai legítimo perante a lei. "Na escola, na família, no trabalho, a nossa família era assumida e aceite. Nunca tivemos problemas de discriminação. A sociedade está mais do que habituada a famílias como a nossa. O que não estava adaptado à nossa sociedade era a lei. Era uma questão de timing político. E de bom senso. E ele chegou." Jorge recorda que este processo de coadoção por parte do companheiro Pedro não será imediato. "Tratando-se de crianças e da salvaguarda do seu interesse, não basta ir à Loja do Cidadão mudar apelidos. Agora o Pedro tem que passar por um processo de candidatura e de entrevistas feitas pela segurança social. Em que será analisado se o Pedro está apto para cuidar de uma criança e o vínculo familiar e afetivo que tem com ela. Será tudo analisado e avaliado. Como deve ser. Estamos felizes. A longa espera acabou". Bernardo Mendonça EXPRESSO «http://expresso.sapo.pt/sociedade/2015-11-20-Nao-sei-como-seria-ter-um-pai-mas-e-bom-ter-duas-maes» Cada criança é uma semente de futuro e cabe a nós, crescidos, oferecer-lhes um solo fértil e nutritivo que lhes permita tornarem-se adultos equilibrados e felizes (20 de novembro, Dia Internacional dos Direitos da Criança). Por Alexandra Rosa, psicóloga, Fale Connosco – Saúde Personalizada Um lar, colo, beijinhos e cócegas, abraços apertados, cavalitas e cambalhotas. Pais e mães que se sentam no chão, brincam com plasticinas, fazem vozes engraçadas e não têm medo de se sujar. Pais e mães com paciência, que deixaram o trabalho e as ralações fora de casa, escutam, entendem e param o mundo para simplesmente as amar. Um lar com afetos mas também com regras, com ralhetes mas sem berros. Ajudas nos trabalhos de casa, aconchegos na hora de dormir, livros declamados na pontinha da cama e monstros expulsos do quarto porque têm que ir sonhar. Cenouras e brócolos no prato, a carne e o peixe, a sopa quentinha e a fruta descascada a rivalizarem com o bolo de chocolate da avó e o gelado que se foi comprar, de mão dada, com o avô. Ir ao médico, levar vacinas e tomar xaropes quando está doente, perante os olhos ansiosos de quem tem um coração apertadinho. A correria com os primos pelos corredores da casa dos avós e tios, idas à praia, brincadeiras nos parques. Pais preocupados com o futuro, a escola e os amigos, pais que passam noites em claro, por doença ou por receio. Ter quem lhes vista um casaco quando elas não querem (apesar de chover lá fora), quem as carregue no colo quando estão cansadas, quem lhes diga sem medo EU AMO-TE MUITO! Quem lhes chame nomes patetas como Fofinho/a, Bebé, Amorzinho ou Príncipe/Princesa. Quem as eduque e explique que se diz por favor e obrigado, que não se dizem mentiras e que os outros — pequeninos e crescidos — têm sentimentos. As crianças têm direito a tudo isto porque isto é ter uma família. Não bastam as pessoas existirem em seu redor, é preciso que elas ofereçam amor, dedicação, comprometimento, limites e segurança. É possível educar sem gritar? O psicólogo espanhol Guillermo Ballenato garante que sim, e explica como. Hoje em dia, os filhos estão a reclamar autoridade, garante Guillermo Ballenato que esteve em Portugal a lançar o seu livro "Educar sem Gritar". É preciso impor regras e limites às crianças, mas também ouvi-las e dar-lhes atenção. Conjugar firmeza e flexibilidade é a chave do sucesso na educação, mantendo a coerência e o respeito. E não basta boa intenção para ser bom pai. Para este psicólogo, as escolas de pais deviam ser obrigatórias. Afinal, se nos exigem carta de condução para guiar, porque não nos exigem um diploma para educar outro ser?A primeira reacção de muitos pais quando olham para o título do seu livro é dizer que tal é impossível. Tem filhos? Nunca gritou com eles? Sim, tenho duas filhas de 15 e 17 anos, e apliquei desde o princípio as técnicas e propostas que aparecem no livro. O meu testemunho é duplo neste caso, como pediatra e pai. É claro que já gritei algumas vezes com elas. Quando faço essa pergunta numa conferência, ou numa sala cheia de pais, todos levantam o braço dizendo que sim, e pressente-se um riso em fundo. Em algum momento, todos os pais perdem a cabeça, mas não é o mesmo perder a cabeça uma vez pontualmente e desculpar-se, e sistematicamente educar aos gritos. Há um provérbio que diz: "Se educas o teu cavalo aos gritos, não esperes que te obedeça quando simplesmente lhe falas." Só te obedecerá quando lhe gritares. Não se trata só da forma, mas também do conteúdo. Um trato negativo, humilhante, desvalorizante faz perder a auto-estima dos filhos e a autoridade dos pais, porque se perde o respeito. Os filhos devem ver nos pais um modelo de conduta, de respeito e de comunicação, e tenderão a imitar o que vêem em nós. Não podemos dizer aos berros a um filho "Já te disse que não grites!", porque com a nossa conduta estamos a dizer que os gritos são legítimos. Em matéria de autoridade, passou-se de um extremo ao outro. Os pais eram autoritários e hoje são negociadores, os filhos discutem com eles de igual para igual. Estamos a ficar demasiado permissivos? Sim, penso que agora se peca pela permissividade. Os filhos estão a reclamar autoridade, precisam de ser postos no seu lugar. Se tudo lhes é permitido, se nada lhes custa a conquistar, estamos a criar crianças inadaptadas. As crianças têm que ter regras, percebê-las e cumpri-las. Há vários estilos educativos, e acredito que nem o autoritário nem o permissivo ou liberal, nem tão pouco o paternalista ou sobreprotector, funcionam. Penso que o estilo democrático e dialogante é o que resulta melhor. Note-se que não existe uma relação de igualdade, os filhos não estão ao nível dos pais, mas há uma comunicação fluida entre as duas partes. Estão a regressar algumas vozes conservadoras na forma de educar as crianças. A questão é que existe uma confusão enorme acerca do que é a autoridade dos pais. A autoridade que reivindico é moral, fruto da competência, coerência e do sentido de justiça. Um pai injusto ou incoerente é um pai que perdeu a autoridade. A autoridade não vem por se castigar mais. Os castigos são aceitáveis? Sim, mas devem ser o último recurso. Devem ser aplicados pontualmente, com pré-aviso, e têm de ser razoáveis. Por outro lado, deve ser anunciado calmamente à criança - e não a quente -, e deve ser imediato após a conduta errada da criança. E o pior castigo é a ausência de atenção. Ser justo é tão difícil que a prudência aconselha a ser-se benévolo e suave nos castigos. Qual é então o grau certo de autoridade e como exercê-la correctamente? Um pai que tem competência para educar, que é autoconfiante, que é um pai feliz, um exemplo e modelo de carisma que apeteça seguir, conquista uma autoridade moral enorme. Nos primeiros anos de vida, as crianças devem ter normas muito claras e fixas. Se, um dia, um pai recusa uma coisa para no dia seguinte a permitir, rapidamente terá um problema, as crianças detectam todas as incoerências. É essencial ser-se sistemático, e isso é válido ontem, hoje e amanhã. Deve dizer-se que as crianças não podem dormir na cama dos pais, e não abrir excepções. Quem permite excepções uma, duas, três vezes, perde a mão e vive numa discussão constante. A arbitrariedade é o pior inimigo da educação. Mas ao descrever um bom pai parece estar a falar de um líder político ou de um gerente de empresa. Não se exige hoje demasiado dos pais? Sim, sei que é muito difícil. Mas essa é uma boa comparação: o que faz hoje um líder numa organização? Cuida e confia nos seus funcionários. O que deve fazer um pai? Também cuidar e confiar nas capacidades dos seus filhos. Deve estar com eles, dedicar-lhes tempo, o mesmo que deve fazer um bom chefe. É evidente que não há máquinas perfeitas de educar, mas modelos e regras a seguir. Quando os casais decidem ter filhos estão conscientes da enorme dificuldade que é educar uma criança? Têm formação suficiente para serem bons pais? Não. Não conhecem princípios psicológicos muito básicos, por exemplo não sabem como se explica a conduta humana. Penso que as escolas de pais são fundamentais para dar essas bases. O que quis fazer neste livro é um manual sensato e simples com regras básicas a seguir. Cita no livro uma frase que diz que os pais chegam a estar tão convencidos que os educadores e os psicólogos sabem o que é melhor para as crianças, que se esquecem de que eles são os verdadeiros especialistas nos seus filhos. Acabam por educar por livros e revistas e não com o seu bom senso ou razão. Isto não cria pais ansiosos e inseguros? Sim, por isso repito que a escola de pais - nos centros, nas escolas - devia ser obrigatória. Temos de ter formação para guiar um carro, porque não devemos ter também para educar e formar outro ser? Devíamos ter um diploma para educar, e não o temos. Estas técnicas podem ser ensinadas e há fórmulas e alternativas para resolver alguns dos problemas com que os pais mais se debatem. Só com boas intenções não se pode educar. Como ajustar o grau certo de firmeza e flexibilidade no estilo educativo democrático e dialogante que defende? A verdadeira chave está em ser suficientemente firme e claro nas regras, ponderando-as, e suficientemente flexível quando um momento o exigir. Se um filho adolescente deve regressar a casa à meia-noite, mas um dia há uma festa especial e todos os amigos vão voltar à uma da manhã, se para o filho isso for essencial para que esteja integrado e se sinta parte do grupo, pode permitir-se que chegue mais tarde. Os pais hoje em dia fazem os trabalhos de casa com os filhos, estudam com eles, vigiam os seus deveres. Isto é bom ou mau? Os pais devem relaxar e dar espaço aos filhos para aprenderem sozinhos - na escola, com os colegas e professores -, dando-lhes essa responsabilidade. Esse é o seu trabalho. Adoro a frase "Se queres ver uma criança com os pés na terra, coloca-lhe sobre os ombros uma responsabilidade". E não se devem julgar os filhos pelos seus resultados escolares, mas sim pelo seu esforço. Jamais olhei para a agenda das minhas filhas para ver que deveres têm para o dia seguinte. Nem nunca o farei. Elas sabem que estudar é o seu trabalho, que isso é a sua vida, e que têm essa responsabilidade. Explico-lhes como fazer, dou-lhes métodos e incentivo, mas não me substituo a elas na assunção de responsabilidade. Quais são os maiores erros que os pais cometem na educação dos filhos? Não dar importância aos primeiros anos de vida - dedicar-se aos três primeiros anos é um enorme investimento para o futuro. E também serem demasiado permissivos e brandos, não lhes impondo limites nem regras. Está a aumentar a ansiedade e depressão entre as crianças? Sim, sem dúvida que está a crescer. E aumenta sobretudo de maneira alarmante a intensidade deste tipo de crises. Encontro crianças que parecem adultos em miniatura. E são sobretudo meninos que têm uma jornada pesadíssima, que têm inglês, natação, ginástica, informática, andam numa correria o dia todo e não têm tempo para serem crianças e brincar. Uma educação muito competitiva causa stress e ansiedade. O pais devem preocupar-se, sim, com a felicidade dos seus filhos hoje, e não excessivamente com o que serão quando forem grandes. Todos querem filhos bem sucedidos profissionalmente, mas isso só acontece se forem crianças felizes e não sobrecarregadas. Qual a importância dos reforços e recompensas na educação e como administrá-los correctamente? A recompensa é muito importante, deve ser esporádica e pública. O melhor prémio é o reconhecimento e o elogio. Mas a recompensa não deve ser excessiva. Por exemplo, eu jamais dei um presente às minhas filhas pelos seus êxitos na escola, isso é o seu trabalho e o seu dever. O contrário descamba facilmente numa situação em que as crianças dizem: "Se não há prémio, não o faço." Fala em aproveitar o poder das nossas expectativas sobre os nossos filhos. Dar-lhes autoconfiança elogiando e elevando-lhes as metas. Há duas ideias-chave na educação. Uma é a atenção - esta é a grande maravilha à disposição de todos os pais, é fácil e grátis. É o maior prémio, e o pior castigo é a retirada de atenção. A outra é convicção. A sua expectativa e crença nos filhos origina uma realidade. Se um pai diz a um filho "sei que o vais fazer bem", as hipóteses de isso acontecer são maiores do que se disser "não sei se consegues". Estimular a autoconfiança nas crianças é uma ferramenta poderosíssima. É quase como uma profecia autocumprida. Se se pegar num recém-nascido e se quiser fazer dele um delinquente, é fácil. Os bebés são uma página em branco. Podemos fazer deles quase tudo o que quisermos. Mas que lugar cabe ao material genético de cada criança, o seu próprio feitio? A personalidade não é só resultado da educação... há filhos educados da mesma maneira que são totalmente diferentes. Sim, a ideia de página em branco é metafórica. Mas, se tivesse de apontar um número, diria que 80% vem da educação e 20% da genética. Numa família com três filhos, por exemplo, é surpreendente o impacto da ordem de nascimento nas suas personalidades. Estatisticamente, é significativo que o filho mais velho tende a ser mais responsável, com alta resistência à frustração, com repetição do papel materno e paterno; o filho do meio tende a ser o rebelde, o criativo; o filho mais novo divertido, gracioso, conciliador, mas mimado e com baixa resistência à frustração. Uma educação eficaz não é igual para todos os filhos. Deve ser adaptada ao feitio de cada criança. Guillermo Ballenato é psicólogo, docente e escritor, especialista em Psicologia Educativa, Psicologia Clínica, Industrial e de Formação. O seu último livro, "Educar sem Gritar", um best seller em Espanha, acabou de ser lançado em Portugal pela A Oficina dos Livros. Escreveu-o na qualidade de psicólogo e pai de duas adolescentes. Guillermo trabalha na Universidade Carlos III de Madrid, no Programa de Aperfeiçoamento Pessoal e Assessorias Técnicas de Estudo do Gabinete Psicopedagógico. Na psicoterapia, é especializado nas áreas da depressão, ansiedade, obsessões, dificuldades de aprendizagem, comunicação e relação. Mafalda Anjos - Família EXPRESSO «http://expresso.sapo.pt/life_style/familia/faltam-regras-na-educacao-das-criancas=f508483» |